América Latina

Uruguai: Frente Ampla faz 45 anos e continua olhando para o futuro

14/02/2016

Com 45 anos, a Frente Ampla (FA) do Uruguai tem o desafio de preservar os princípios que traz desde a fundação em acionais de 5 de fevereiro de 1971 e de defender o pensamento de Líber Seregni, seu criador: “Com o povo tudo, sem o povo nada”.

A FA, constituída por diversos partidos e movimentos políticos, “não existe sem unidade, partamos desta afirmação”, disse em entrevista à agência Prensa Latina Agustín Canzani, diretor da Fundação que leva o nome do seu primeiro líder e presidente.

O que une essas correntes, e esse é o conceito da unidade, é antes de tudo um acordo programático que o Uruguai se propõe para desenvolver um conjunto de tarefas a curto, médio e longo prazos.

O conceito de unidade de ação compreende também estarmos obrigatoriamente juntos nas disputas eleitorais, disse.

Portanto, destacou, o conjunto dos eleitores dos grupos políticos que constituem a Frente Ampla estão unidos por esses dois elementos.

Canzani acrescentou que, adicionalmente, há “uma espécie de afeto comum que vai se gerando na FA que tem a ver com reunir esforços para que essa unidade não só se mantenha em termos formais, mas também em termos substantivos”. O diretor da Fundação Liber Seregni, que também é cientista político, apontou que o primeiro aspecto pressupõe certa disposição dos grupos e de seus dirigentes para escutar uns aos outros, e adicionalmente, introduzir de alguma maneira, sobretudo por parte dos que podem ser majoritários, os pontos de vista de outros grupos para gerar uma síntese política.

Parece-me que esse é um elemento fundamental, e “então a unidade tem sido e vai continuar sendo um elemento central da Frente Ampla”, afirmou.

Ao ser questionado sobre as adequações que hoje pedem para que a Frente Ampla faça na atual conjuntura nacional e internacional, Canzani afirmou que a organização política de esquerda se ajustou à realidade do Uruguai e por isso subsiste.

Do meu ponto de vista, disse, a FA tem alguns desafios propostos, como o de adequar seu programa político a um país que é novo, pelas mudanças que foram realizadas nos últimos 10 anos, e, portanto, há novas demandas sociais, as quais são diferentes das que existiam há uma década.

Por exemplo, apontou, quando a Frente começou a governar em 2005 as grandes prioridades eram o emprego e a pobreza porque vínhamos de uma crise muito forte, “mas temos de continuar, e devemos, incrementando os salários e a renda da população”.

Também, “temos que continuar mantendo o crescimento, atender os problemas ligados à desigualdade e tratar de fazer esforços para melhorar”.

Canzani disse que o país tem uma maior cobertura de bens e serviços públicos, mas há que melhorar sua qualidade em Educação, Saúde e Transporte.

As pessoas reclamam cada vez mais do Estado, não somente da cobertura de seus serviços públicos, mas também da qualidade, o que é um pedido muito razoável, disse.

Um país que tem a produção do Uruguai, refletiu, propõe-se problemas de sustentabilidade ambiental, de crescimento, desigualdades territoriais e desafios de sua inserção no marco internacional, que são totalmente diferentes.

Canzani destacou que “aí tem uma agenda nova e a Frente tem que responder como sempre”.

Se um partido ou uma força política tem que mudar a realidade, uma das principais coisas que deve fazer é ler essa realidade, fazer sua interpretação política e procurar adequar seu programa de governo e de ação, apontou.

O diretor da Fundação Líber Seregni destacou que a FA é um partido que “claramente pode ser identificado na esquerda latino-americana, com todas essas variações que existem na região, que são muito amplas”.

Parte de suas características, opinou, têm a ver com o país: “A FA não pode ser entendida sem entender a lógica do sistema político uruguaio, inclusive sua lógica eleitoral”.

Esta coalizão sempre teve um programa de reforma, que visto em perspectiva, é claramente um programa transformador na América Latina, estimou.

Ao avaliar os aspectos positivos e negativos atingidos na última década pela Frente, comentou que a base econômica da sociedade uruguaia cresceu enormemente “em um marco de razoável estabilidade em termos macroeconômicos e isso é maior riqueza para o país e para se distribuir”.

O Uruguai tem hoje um Produto Interno Bruto que é quase o dobro do que tinha no momento da crise, e isso é importante, destacou.

Dessa forma, buscou que esse crescimento “não fosse apropriado apenas por alguns setores da sociedade”, mas que fosse redistribuído com ênfase aos mais prejudicados pela crise, “os setores pobres, basicamente trabalhadores, e o fez com políticas diferentes, com políticas sociais”.

No combate à pobreza há claramente uma definição da FA que começou no primeiro governo, quando ainda não estava muito claro que se cresceria, mas já havia uma decisão de proteger e promover esses setores, acrescentou.

Canzani também destacou uma dimensão importantíssima, “que mesmo que ainda falte, foi muito relevante”, que foi abrir uma agenda de direitos, incluídos os Direitos Humanos e reclamos da população ou grupos importantes que pedem a despenalização do aborto e o casal igualitário, entre outros.

Sobre como enxerga internamente a direção da Frente Ampla, o cientista político manifestou que “é uma tarefa que tem que começar já”.

Eu valorizo muitíssimo a liderança que a Frente tem tido, “é a geração que fez a travessia do deserto e tem tido a capacidade estratégica de ver e pensar”, o que é muito valioso.

Destacou que agora há claramente uma mudança na direção que tem o desafio de se validar política e eleitoralmente, o que não é pouco.

Essa mudança, aludiu, também tem que incorporar a diversidade de pontos de vista que há na FA, “que já é maior porque não só é ideológica, mas também geracional”.

Eu digo que existem pelo menos quatro elementos que começam a ser importantíssimos: o gênero, as gerações, as identidades e os territórios.

Para mim, refletiu, parece que a geração que vai tomar o comando tem que ter diálogos profundos “para não herdar os conflitos dos mais velhos”, mesmo que tenham seus próprios conflitos, disse.

Ao se referir ao centenário do nascimento do general Líber Seregni, que será comemorado em dezembro deste ano, o diretor da Fundação indicou que sua vida, ação e seu pensamento são um legado fundamental para toda a democracia uruguaia, não só para a FA.

No dia em que ele saiu da prisão, sua primeira mensagem foi muito particular, disse que somos uma força política construtiva: “operários da construção da pátria do futuro”.

Por isso a ideia de Seregni de “pensar o futuro é o grande desafio da Frente Ampla neste ano, porque há que construir o futuro”, concluiu.

Fonte: Prensa Latina

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