Cuba
Rolando González: “O povo cubano saberá defender sua revolução”
Rolando González, 64 anos, é um veterano diplomata cubano. Já serviu na Tunísia, Líbia, França, Haiti, Bolívia e Paraguai. Nestes dois últimos países exerceu a função de embaixador. Foi também Conselheiro junto à Unesco. Atualmente é o Encarregado de Negócios da Embaixada de Cuba no Brasil. Desde o golpe contra a presidenta Dilma, em 2016, a ilha caribenha não mantém um embaixador em território brasileiro
Por Wevergton Brito Lima (*)
Nesta entrevista, concedida durante a realização da 24ª Convenção de Solidariedade a Cuba, que começou na quinta-feira (20) e termina neste sábado (22), em Santos (SP), Rolando fala sobre o papel da solidariedade, a relação com governos de extrema-direita, aborda as consequências do recrudescimento do bloqueio, a atuação da contrarrevolução, e diversos outros temas, sempre com a habilidade de um diplomata, mas ao mesmo tempo com o ardor de um revolucionário.
O que fica patente quando garante, com os olhos brilhando e a voz firme: “O povo cubano saberá, mais uma vez, defender sua Revolução!”.
Nesta quinta-feira tivemos o primeiro dia da 24ª Convenção de solidariedade a Cuba. Qual a importância desta convenção?
Rolando González: Nós damos uma grande importância a esta Convenção. Em primeiro lugar porque reflete a expressão do sentimento de admiração, de carinho, de respeito, de amizade, de solidariedade do povo brasileiro com a nossa Revolução. Nesta Convenção temos uma participação muito importante de 15 estados do Brasil. Estão presentes movimentos sociais, partidos políticos, Comitês de Solidariedade, Associações Culturais José Martí, que se reúnem para estabelecer objetivos de trabalho, projeções, prioridades. A solidariedade, portanto, tem um papel muito importante para nós em toda a história da Revolução.
Desmascarando as mentiras, defendendo a realidade cubana, com suas virtudes e certamente, também, com seus defeitos, mas muito longe da distorção e da imagem negativa que os meios hegemônicos tentam impor como matriz de opinião. A solidariedade tem para nós um significado muito elevado de incentivo e de respaldo ao nosso povo que resiste há 60 anos a esta guerra econômica, política, midiática, da primeira potência do mundo, e a custo de muito sacrifício e esforço mantemos vitoriosa a Revolução, recebendo o carinho e a solidariedade de uma parcela muito grande da humanidade, que já há muito tempo tem um papel muito importante na denúncia do bloqueio e da ocupação ilegal e arbitrária de Guantánamo.
O Brasil vive, com Jair Bolsonaro, a experiência de um governo de extrema direita, que repete, sobre Cuba, todas as calúnias e mentiras divulgadas pelo imperialismo. Como o corpo diplomático cubano no Brasil lida com esta situação?
A direita e a extrema-direita têm ocupado a direção de vários países em distintas etapas ao largo destes 60 anos de nossa Revolução. Muitos governos de direita e de extrema-direita romperam relações com Cuba no ano de 1964 por ditame da OEA, por pressão norte-americana. Cuba ficou completamente só na região, com a honrosa exceção do México, que foi o único país que manteve relações diplomáticas com Cuba. Durante muitos anos Cuba atuou praticamente só, até que os governos se foram dando conta do prestígio, da autoridade moral, da autoridade política da Revolução cubana e do nosso máximo líder, companheiro Fidel, e foi se despertando o interesse do povo da América Latina e de seus Governos, inclusive da imensa maioria de governos de direita e extrema-direita, em um relacionamento respeitoso, independentemente das diferenças políticas e ideológicas que existiam, e assim se começou a partir do ano de 1972 a se reestruturar as relações diplomáticas de todos os países da região com Cuba e isso, repito, não aconteceu a partir somente de governos de centro ou de esquerda.
Não, estes passos de restabelecimento de diálogos políticos, comerciais, culturais, se estabeleceram a partir de governos de direta e ultra-direita, que assumiram compromisso de respeito às diferenças. Para isso contribuiu também a posição solidária de Cuba, ante fenômenos de desastres naturais que ocorreram e nos quais a Revolução Cubana sempre interveio para dar apoio e solidariedade. Os médicos cubanos enviados a estes países para ajudar em casos de furação, inundação e outra calamidades, iam apenas com a visão do humanismo e da solidariedade. Alguns governos de direita reconheceram o valor desta colaboração, o valor da amizade de Cuba. Agora, quando vivemos um novo giro de direita em muitos países da América Latina, na maioria dos casos tem prevalecido o respeito às diferenças e as relações se mantêm com bastante normalidade com Cuba e isso é o que desejamos.
A experiência já mostrou que diferenças enormes no plano político não devem afetar as relações de amizade entre os povos. Ainda mais no caso das relações Cuba-Brasil, que têm tantos laços cultuais, históricos, comerciais de tremenda importância. Temos o caso de diversos empresários brasileiros que empregaram seu capital a serviço desta relação comercial com a ilha, inclusive com obras de infraestrutura no Brasil e em Cuba. Esses empresários merecem que sejam defendidos, merecem respeito, e Cuba incentiva a continuidade destas relações comerciais, culturais, baseadas na não ingerência nos assuntos internos e no respeito aos princípios de convivência entre as nações estabelecidos na carta das Nações Unidas e no direito internacional, e sobre esta base pensamos que, apesar das diferenças, devemos continuar os vínculos com o Brasil.
Com a ativação, ordenada por Donald Trump, dos capítulos três e quatro da Lei Helms-Burton, o bloqueio contra Cuba recrudesceu. Qual o significado deste recrudescimento e suas consequências para o povo cubano?
Com a administração Trump de fato tem havido uma escalada da hostilidade contra Cuba. Uma das expressões desta hostilidade foi a aplicação pela primeira vez, desde que foi adotada a lei Helms-Burton, em 1996, do seu capítulo número três, que todos os presidentes norte-americanos suspendiam, até então, por seu caráter extraterritorial por seu caráter ingerencista, pois afeta a relação com terceiros países aliados dos EUA, europeus, latino-americanos, asiáticos, que têm investimentos em Cuba.
Você pode explicar ao leitor do Vermelho o que é a lei Helms-Burton e o que prevê seus capítulos 3 e quatro?
Claro. A lei Helms-Burton pretendeu normatizar e dar corpo jurídico integral a todas as ações judiciais e a todos os decretos, a todas as normas que têm a ver com a guerra contra Cuba. A Lei Torricelli de 1992 impedia qualquer barco que tocasse um porto cubano de atracar em um porto dos EUA por seis meses, o que constituía a intenção de afetar nosso comércio exterior. Isso se mantem vigente nos marcos da lei Helms-Burton, assim como a proibição de norte-americanos de viajar a Cuba. Cuba é o único país do mundo para o qual um cidadão norte-americano é proibido de viajar por lei. E existiam também sanções de diversos tipos, inclusive atingindo a comunidade cubana nos EUA e seus familiares em Cuba. Tudo isso levou a esta lei Helms-Burton em 1996 que em seu primeiro capítulo codifica todo esse ramo de leis e normas.
Em seu capítulo dois esta lei narra, descreve, com total desfaçatez, toda a pretensão de domínio total da ilha. Este capítulo dois foi o que W. Bush concebeu em seu plano Bush para o que viria depois da destruição da Revolução Cubana. Ele (o capítulo) narra, descreve como seria a intervenção, como seriam aniquiladas as forças revolucionárias, como seria o processo de recuperação de todas as propriedades nacionalizadas. Durante toda esta etapa, segundo este capítulo, o bloqueio permaneceria até que o saque se completasse. Tudo isso é descrito de forma aberta, desavergonhada, inclusive prevendo a nomeação de um interventor norte-americano. É algo verdadeiramente escandaloso.
No capítulo três se abre a possibilidade a cidadãos norte-americanos ou a cubanos que vivam nos EUA, cujas propriedades foram nacionalizadas em 1960, a apresentar demandas judiciais dentro do sistema judicial norte-americano contra empresas estrangeiras, sejam brasileiras, italianas, espanholas, que tenham feito investimentos ou estejam trabalhando nas áreas ou propriedades que foram nacionalizadas. Isso tem em vista pressionar, ameaçar, para fazer com que se retirem os investidores que já estão em Cuba e evitar que surjam novos. É uma ação de chantagem, de ameaça, de intimidação contra o empresariado internacional. Isto gerou uma resposta muito vigorosa por parte da Europa, do México, do Canadá, de muitos países, que têm investidores em Cuba e que têm leis antídotos contra esta lei Helms-Burton em suas legislações nacionais.
Isso também gerou um rechaço enorme em nosso povo e em nossos amigos da solidariedade internacional porque, segundo o capítulo três, seriam tomadas terras onde os camponeses plantam e que as receberam fruto da reforma agrária feita pela Revolução, que acabou com o latifúndio. Seriam tomadas fábricas onde os operários trabalham, ou escolas onde os filhos do povo estudam. Obviamente todo o nosso povo conhece perfeitamente todas estas intenções e tudo que esta lei desperta é mais consciência, mais resistência, compromisso de luta para conservar as conquistas da Revolução. A lei tem um efeito contrário ao que eles pretendem, de nos intimidar. Isto não tem nenhum sentido para nosso povo, que é um povo rebelde, patriótico, com uma profunda convicção independentista.
O quarto capítulo da Lei Helms Burton fala em sancionar as empresas que investem em Cuba, que fazem comércio com Cuba, proíbe familiares destes empresários de visitarem os EUA, proíbe bancos americanos, ou que tenham acionistas americanos, de fazerem transações com estes empresários.
O recrudescimento do bloqueio é um fato, pois a administração Trump aplicou o capítulo 3 que nunca tinha sido acionado, implementou sanções adicionais e faz contínuas provocações contra nosso povo. Por exemplo, o governo dos EUA acaba de incluir Cuba, de maneira vergonhosa, no que eles chamam de “lista negra” de nações que não fazem o suficiente para deter o tráfico de pessoas, quando Cuba tem uma postura de total cooperação, de total compromisso no enfrentamento a essa prática. Assim, com um critério seletivo e rasteiro nos incluem nestas listas. Tudo isso é uma guerra onde se tenta desmoralizar, asfixiar e liquidar a Revolução Cubana. Eles não desistem deste objetivo, e a administração Trump tem feito um esforço considerável neste sentido, mais do que outras administrações.
Estão buscando bloquear nossas transações financeiras, nos proíbem acesso a crédito, nos dificultam transferências bancárias, seja para pagar, seja para receber, nos impõe dificuldades para exercer nosso comércio exterior. O direito internacional e a carta das Nações Unidas reconhecem que uma nação tem o básico direito a exercer livremente seu comércio com outras nações. Enfim, como já disse, é uma guerra para tratar de nos asfixiar por fome, por enfermidade e tentar obrigar a que nos rendamos.
Em sua avaliação Cuba corre o risco de viver um novo período especial?
Cuba viveu um período especial muito particular. Foi resultado da queda do campo socialista e da União Soviética, com o qual Cuba mantinha 85% do seu comércio exterior. E comércio exterior que incluía a aquisição de combustíveis. Quando este comércio exterior acabou, Cuba ficou também sem acesso ao combustível. Sem combustível não tínhamos como fazer andar a agricultura e a indústria. Sem agricultura e indústria não podíamos exportar para obter divisas e assim comprar petróleo. Então estávamos em um círculo vicioso que fez com que, em um ano, nosso PIB caísse 34%.
E foram condições verdadeiramente duras, e nosso povo resistiu baseado na convicção de sustentar a independência, de sustentar as conquistas sociais, que foram preservadas apesar de toda esta situação. Cuba teve que fazer grandes esforços, e adotar políticas para contornar esta situação. O desenvolvimento do turismo, a permissão de remessas de divisas do exterior para Cuba, que beneficiaram cubanos que tinham familiares, irmãos, pais e primos, nos EUA e em outros países, o que trouxe uma nova fonte de riquezas, que, por outro lado, não derivava do suor, do esforço, da formação profissional dos nossos cidadãos. Este período especial trouxe severos danos à ordem social, à ordem econômica. Este não é o cenário de Cuba hoje.
Nosso país está sofrendo consequências terríveis pelo recrudescimento do bloqueio, pela aplicação da lei Helms-Burton, mas existe uma economia mais consolidada, mais diversificada, mais desconcentrada. Hoje temos muitas linhas consolidadas de exportação. São graves, reitero, as consequências. Temos sérias restrições, por exemplo, para importar insumos para medicamentos. Neste setor temos 80 linhas de medicamentos que estão em falta, em 600 linhas com as quais trabalhamos.
Temos dificuldades enormes para importar produtos horto-alimentícios que, no comércio exterior, usualmente são comprados, quando se trata de grandes quantidades, diante da obtenção de créditos que, por pressão norte-americana, não são disponibilizados para as empresas cubanas. Estão deficitários diversos produtos de primeira necessidade no país. Estão escasseando peças de reposição para equipamentos médicos, e isso sem dúvida tem se incrementado. Mas penso que temos uma situação muito diferente da que tínhamos nos anos 90. Cuba hoje tem uma força econômica, uma organização econômica que nos dá capacidade de conservar as conquistas sociais e defender a Revolução em melhores condições.
Como você mencionou, a ativação dos capítulos 3 e 4 da Lei Helms Burton gerou reações inclusive de aliados dos EUA. Como a diplomacia cubana trabalha esta contradição?
Na realidade estas contradições surgem fruto de uma reação obrigatória e legítima do exercício soberano por parte dos terceiros países afetados, que estão se sentindo obrigados a defender seus empresários que fizeram investimentos em Cuba, que têm negócios com Cuba. Estes países reagem contra o caráter extraterritorial que tem esta lei. Cuba, em sua diplomacia, em sua política exterior, chama a atenção, denuncia o aspecto genocida e ingerencista desta prática e trata de despertar o rechaço dos governos e dos povos.
Chamamos a atenção de que nosso povo sofre em consequência destas ações unilaterais, que afetam também os interesses de terceiros países. Tratamos de sensibilizar a opinião pública contra a gritante injustiça que se comete contra uma ilha que apenas o que quer é exercer seu direito de autodeterminação, o exercício independente de nós mesmos decidirmos nosso destino. Uma ilha que é solidária com o mundo. Que tem uma ética inatacável em sua conduta política internacional e nacional. Este povo que há 60 anos tem resistido, merece todo o respaldo e apoio da comunidade internacional frente a uma postura tão indigna e tão miserável que se aplica contra nosso país.
Por que o Canadá diminuiu sua representação diplomática em Havana?
O Canadá é o responsável pelo maior afluxo de turistas a Cuba. Uma empresa canadense é uma das principais investidoras em Cuba. O Canadá é um país que tem relações econômicas e comerciais muito importantes com Cuba. Recentemente em Cuba nos visitaram o chanceler e o primeiro-ministro canadenses, com os quais travamos diálogos de alto nível. Os EUA, é claro, tratam de tentar arrastar o Canadá em sua campanha contra Cuba, e por conta disso temos com o Canadá alguns desencontros por conta de questões políticas e ideológicas, mas o que tem prevalecido é o respeito às diferenças e a convivência amistosa entre Cuba e Canadá. No fundamental, o governo canadense não tem cedido às pressões estadunidenses e reagiu contra a aplicação do capítulo 3 da lei Helms-Burton.
Recentemente Cuba modificou sua Constituição, inclusive incorporando elementos sobre a atualização do modelo econômico. Como você avalia este processo?
Veja, depois da superação do período especial, se foram adotando mudanças, iniciativas que exigiam atualizações na última Constituição do país, datada de 1976. Essa evolução, esses ajustes, estas mudanças dialéticas, que buscavam melhores soluções, de acordo com os interesses e necessidades do nosso povo, sobretudo na ordem econômica e social, objetivamente requeriam uma nova Constituição. E assim se iniciou um processo de consulta a nossa população sobre a ordem política, econômica e social que o povo desejava.
As diretrizes da Revolução foram referendadas pelo nosso povo, que teve um papel determinante, introduzindo mudanças em mais de 60% do projeto inicial do novo texto constitucional. E isso necessitava de ser referendado em uma nova Constituição, em uma “lei das leis”, com todo o ordenamento da República. O que foi feito com plena participação popular, e a nova constituição foi aprovada em um referendo onde 85% dos participantes respaldaram a nova Constituição. Neste novo texto deixamos claro o que queremos, aonde queremos chegar, o papel de cada instituição, o papel do Partido (Comunista de Cuba) como vanguarda da construção da nova sociedade que estamos forjando. Se consolidaram e normatizaram as mudanças na ordem econômica, como a regulamentação do trabalho por conta própria, tendo o estado deixado de exercer determinadas atividades que são desempenhadas melhor pelo trabalho por conta própria.
Os trabalhadores por conta própria são hoje cerca de 500 mil pessoas, que gozam igualmente de todos os benefícios de segurança social cubana. A Constituição reafirmou o caráter socialista, humanista e solidário da sociedade que estamos construindo. Sessenta anos depois, reafirmamos os princípios e objetivos essenciais da Revolução Cubana. Foi um exercício de extraordinário patriotismo, de extraordinário compromisso com o ideal de Fidel, com a obra de Fidel, e estamos confiantes que seguiremos com nosso projeto, vitorioso há 60 anos e que seguiremos consolidando.
Miguel Díaz Canel assumiu há pouco mais de um ano o posto de presidente do conselho de estado. É o primeiro nascido depois de 1959 a assumir uma responsabilidade tão elevada, justo em um momento tenso e repleto de ameaças. Como você avalia este período com Miguel Díaz Canel à frente do governo?
Creio que é um privilégio enorme da história. E creio que Cuba merecia este privilégio, de contar com um presidente, como o companheiro Díaz Canel, que representa a continuidade da Revolução, com a absoluta confiança do nosso povo. Ele tem a firmeza, o compromisso e a capacidade para assumir um papel tão relevante em um momento tão significativo como o que vive o nosso país. É a hora do partido, do povo, da nossa unidade, garantir a continuidade e não permitir nenhum desvio no plano político e ideológico de princípios. E creio que o nosso presidente encarna de maneira mais do que convincente este sonho do nosso povo. Não temos o mais mínimo temor de depositar plena confiança neste companheiro.
E por isso essa resposta do povo em relação a nova Constituição. Por isso a resposta da unidade, de garantir a unidade como um princípio fundamental. Vimos há poucos dias o presidente Díaz Canel dizer que não negociaremos jamais a dignidade, a independência, os princípios, o humanismo e a solidariedade. Jamais negociaremos com o império diante de ameaças e chantagens. E isso é o que pensa o nosso povo, que saberá, mais uma vez, defender sua Revolução. E quando isso se expressa no presidente, isso desperta muito compromisso, muita segurança na continuidade.
O jornal Granma noticiou que desde 20 de janeiro de 2017 o governo dos Estados Unidos destinou mais de 22 milhões de dólares para financiar a subversão interna em Cuba, como o governo cubano lida com esta situação?
Na verdade, este valor representa apenas parte do financiamento à subversão. Isso é apenas o que eles declaram publicamente. Nós sabemos que é muito mais o que eles destinam à subversão e à tentativa de liquidar a Revolução Cubana. Esses recursos estão destinados a organizações que promovem o desalento, que promovem influências negativas em setores da sociedade, sobretudo na juventude. São financiamentos destinados a manchar a imagem de Cuba no exterior, destinados a criar uma contrarrevolução mercenária dentro de Cuba. Esses recursos são usados para financiar viagens de contrarrevolucionários e dar sustentação material à contrarrevolução, criada por eles e a serviço deles, e obviamente nosso povo enfrenta esta subversão desde uma visão integral. Desde um esforço integral.
Onde estão unidos neste esforço nosso Ministério da Ordem Interior, nosso partido, as organizações de massa, os movimentos sociais, o que inclui os Comitês de Defesa da Revolução, a Federação de Mulheres, a União de Jovens Comunistas, e todo nosso povo, unido, vigilante, e dando resposta enérgica a todas estas manifestações de intervenção, com uma experiência de 60 anos, com um “know-how” que se desenvolveu consideravelmente no exercício de defesa do nosso povo. E realmente, lidamos há 60 anos com esta subversão e frustramos e derrotamos a maioria dos seus planos, que afinal fazem parte de uma política fracassada para manter viva esta guerra e para manter contentes os mercenários que trabalham para eles.
Rússia e China explicitamente fazem referência à Guerra Híbrida como uma arma que o imperialismo usa contra as soberanias nacionais. Qual sua opinião em relação a isto?
A guerra permanente que os EUA promovem para manter sua posição de potência unipolar no mundo gera muita resistência dos povos e de países. Países como China e Rússia que são potências emergentes. Cuba vê o diálogo, o consenso internacional, o respeito à Carta das Nações Unidas, o respeito ao direito internacional, a solução negociada dos conflitos, como caminhos para a melhor convivência pacífica possível. Obviamente nos somamos à maioria da comunidade internacional nos esforços para enfrentar a pretensão, por parte do império e de seus aliados, de submeter, através de um mecanismo universal, a vontade de povos e nações a seus interesses.
Nesta ofensiva contra a América Latina eles empregaram toda a tecnologia, muitos recursos, todo o avanço da técnica de informação, controle de toda a mídia hegemônica, manipulação das redes, todo este fenômeno tem um efeito determinante nesta ofensiva estadunidense na região.
Com Cuba eles tinham mais dificuldades de usar esta técnica de “golpes brandos” porque lhes faltam mecanismos para influir na sociedade cubana. Por isso chegaram a propor o restabelecimento de relações diplomáticas com Cuba, aproximação com Cuba, para poder influir desde lá de dentro, em setores aos quais eles não têm acesso, como a juventude, imprensa, como as forças armadas, como o sistema judicial, setores nos quais eles têm grande influência no resto do Continente. Por isso esta política de Obama, de aproximação, que afinal Trump mudou completamente, subordinado aos interesses da contrarrevolução cubana da Flórida. Ele não só mudou o método que Obama pretendia empregar como fortaleceu as sanções, a hostilidade e o apoio à subversão interna.
Em sua opinião, com a escalada da tensão entre EUA e Irã, a tendência é amenizar a tensão com a Venezuela?
Não creio. Os EUA têm lutado contra a Revolução bolivariana desde o primeiro governo Chávez. Eles não cessaram jamais as agressões políticas, econômicas e a sabotagem contra a Venezuela. Eles não vão abandonar esta política de tentar dominar o país bolivariano, assim como também querem dominar o Irã. É a mentalidade imperialista.
A Convenção de solidariedade a Cuba termina neste sábado. Do seu ponto de vista, qual a principal tarefa da solidariedade a Cuba no próximo período?
A prioridade deste movimento de solidariedade e de todos os amigos de Cuba é a luta contra o bloqueio, contra o recrudescimento do bloqueio, contra a aplicação da Lei Helms-Burton e dos seus capítulos 3 e 4, contra a ocupação do território cubano em Guantánamo, contra a inclusão de Cuba em listas espúrias criadas pelos próprios EUA.
A luta contra estes atos injustos constitui, a meu ver, a principal mostra de solidariedade que Cuba necessita hoje. Além disso, ninguém melhor do que o movimento de solidariedade pode enfrentar a campanha de mentiras contra Cuba, uma campanha permanente de desinformação. Como eu já expliquei, por seu caráter e objetivos declarados, este é um bloqueio genocida. É o bloqueio mais longo que sofre um país em toda a história da humanidade. Neste sentido, o movimento de solidariedade a Cuba é uma fonte permanente de alegria, de alento e de satisfação para nosso povo.
(*) Jornalista, membro da Comissão de Política e Relações Internacionais do PCdoB