Opinião
Nexhmije Hoxha, uma comunista
Por José Reinaldo Carvalho (*)
O falecimento da camarada Nexhmije Hoxha, no último dia 26 de fevereiro, causa profunda tristeza nos comunistas e revolucionários.
Em seus 99 anos bem vividos, a camarada Nexhmije Hoxha foi uma mulher exemplar, combatente, desde os verdes anos de sua juventude, pela libertação nacional, o bem-estar do povo albanês, o socialismo e o comunismo.
Foi uma combativa guerrilheira do Exército Popular de Libertação, uma denodada lutadora durante os anos da gloriosa Luta Antifascista de Libertação Nacional (1944-1949), dirigente da Juventude Comunista Albanesa, da União de Mulheres Antifascistas da Albânia, do Partido Comunista (depois do Trabalho) e da Frente Democrática da Albânia, organização que representava a união das amplas massas populares.
Talentosa marxista-leninista, a camarada Nexhmije Hoxha desempenhou com autoridade a direção do Departamento de Propaganda, Educação e Cultura do Partido do Trabalho da Albânia, do Instituto de Estudos Marxistas-Leninistas do Comitê Central do Partido e da Escola “Vladimir Ilitch Lênin”, que formou milhares de quadros revolucionários na Albânia Socialista e abriu suas portas a camaradas marxistas-leninistas de diferentes partes do mundo, inclusive do Brasil.
A camarada Nexhmije Hoxha foi a companheira de toda a vida do inesquecível camarada Enver Hoxha, grande dirigente comunista, patriota, chefe do Partido, estadista, líder do povo albanês e dos comunistas do País das Águias e internacionalista consequente. Nexhmije Hoxha esteve ao lado do camarada Enver na vida cotidiana e na ciclópica obra que realizou e dirigiu da construção do Partido, do triunfo na Luta Antifascista de Libertação Nacional, do empenho pela construção do socialismo, do combate ao oportunismo de direita e ao revisionismo.
Nexhmije Hoxha foi uma amiga querida dos comunistas brasileiros. Ela e o camarada Enver receberam as delegações da direção do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), lideradas pelo camarada João Amazonas, com afeto e amizade desinteressada, honrando as tradições hospitaleiras milenares do povo albanês.
Como militante comunista e internacionalista, tive a honra de viver, trabalhar e estudar na Albânia Socialista, onde conheci as elevadas virtudes morais e ideológicas do povo albanês e dos dirigentes do Partido do Trabalho sob a direção do camarada Enver Hoxha. Orgulho-me de ter conhecido pessoalmente a camarada Nexhmije Hoxha, com quem mantive edificantes conversações. Dela, como do camarada Enver, mantenho e guardarei por toda a vida indeléveis recordações e uma eterna saudade.
A camarada Nexhmije Hoxha deixa ensinamentos como uma mulher de fibra que não se abateu perante os violentos esbirros reacionários que a encarceraram, no momento mais difícil de sua vida, no auge da contrarrevolução. Demonstrou força e caráter inigualáveis.
Nexhmije Hoxha pertenceu a uma geração de dirigentes que compreendiam a primazia do partido comunista como fator subjetivo da revolução e do socialismo. “Sabe-se que um dos princípios fundamentais do comunismo é o papel dirigente do Partido Comunista na organização, na direção e na realização bem-sucedida das revoluções proletárias e da edificação do socialismo”, escrevia em 1997. Segundo ela, a experiência da construção do socialismo, assim como a derrocada, na Albânia e demais países do Leste Europeu, testemunham sobre a coerência dessa tese leninista não somente do ponto de vista teórico mas também prático.
Para ilustrar o que dissemos acima sobre a amizade de Nexhmije e Enver Hoxha para com os comunistas brasileiros, especialmente o camarada João Amazonas, reproduzo trechos de seu livro “Minha vida com Enver” (ed. Neraida, Tirana, 2001).
Um dos principais quadros do movimento Marxista-Leninista da América Latina, por quem Enver tinha especial estima e confiança foi o presidente do Partido Comunista do Brasil, João Amazonas. Era um velho comunista, de inteligência aguda e longa experiência no Movimento Comunista Internacional.
Entre Enver e Amazonas criou-se uma amizade revolucionária.
Para Enver era sempre motivo de alegria encontrá-lo, considerava cada encontro uma ocasião para aconselhar-se com ele, para “verificar-se” a si próprio (como Enver costumava dizer quando elaborava uma nova ideia ou posição).
Amazonas valorizou altamente o livro de Enver “O Imperialismo e a Revolução”, cuja tradução para o português foi feita com rapidez para sua leitura.
Sempre que vinha à Albânia, Amazonas era acompanhado por sua esposa, talvez em razão do seu estado de saúde. De modo que entre nós formou-se uma espécie de amizade familiar, algumas vezes comíamos juntos, e eles conheceram os nossos filhos. Mesmo depois que Enver já não estava entre nós (faleceu em 8 de abril de 1985, N.doT), nas datas festivas, como Ano Novo, 8 de Março, 1º de Maio, Amazonas, às vezes sozinho, outras conjuntamente com sua companheira, nunca deixava de nos enviar saudações, a mim e à nossa família.
Quando me encarceraram, entre as cartas que escrevi a alguns amigos e camaradas no exterior, uma das primeiras foi ao camarada Amazonas, como o amigo marxista-leninista mais próximo de Enver.
Os meus filhos me informaram na prisão que ele imediatamente organizou uma campanha ampla em sua imprensa e em cooperação com outros partidos Marxistas-Leninistas da América Latina, em defesa da obra e da figura de Enver Hoxha, das realizações socialistas na Albânia socialista e demandando a minha libertação, assim como de outros dirigentes políticos.
Quando eu saí da prisão, além de me enviar saudações, Amazonas me convidou ao Congresso do Partido Comunista do Brasil. Impossibilitada de fazer uma viagem tão longa, fui informada por ele que pretendia enviar à Albânia o Secretário do Comitê Central para as Relações Internacionais, José Reinaldo Carvalho.
Reinaldo era um bom camarada, que tinha trabalhado durante mais de três anos na Rádio Tirana, nas emissões dirigidas à América Latina, aprendeu bem o albanês e mesmo depois de muitos anos distante da Albânia, continuava falando bem a língua albanesa. O seu filho nasceu na Albânia e isto fez com que ele guardasse pela Albânia um amor especial e impressões indeléveis.
Reinaldo não pôde tampouco retornar à Albânia. Encontramo-nos em Bruxelas, por ocasião de um seminário internacional.
Durante os cinco anos na prisão, nada sabia sobre os acontecimentos no Movimento Comunista Internacional, sobre os partidos Marxistas-Leninistas nos diversos continentes. Conversei a esse respeito com Reinaldo, fiz perguntas sobre sua atividade e sobre a saúde de Amazonas. Ele me contou que Amazonas se mantinha o mesmo dos tempos em que conheceu e conversava com o camarada Enver Hoxha. Explicou-me que depois dos golpes sofridos por nossos partidos, depois dos acontecimentos na URSS, na Albânia e em outros países do Leste Europeu, a direção do Partido Comunista do Brasil teve que elaborar uma nova tática. Tal tática visava, disse ele: dentro do país, renovar e reforçar os laços com as massas, e externamente estabelecer alianças com forças com potencial para desempenhar um papel importante no soerguimento das ondas da revolução socialista. (tradução de JRC)
(*) Jornalista, editor do Resistência, membro do Comitê Central e da Comissão Política do PCdoB