História
Memórias de greves operárias
Por Maria Fernanda Arruda (*)
Há uma afirmação registrada pelo Memorial da Democracia que não se ajusta completamente à dimensão histórica dos acontecimentos de 1968.
Ao referir-se à greve de Osasco, realizada em julho de 1968, consigna:
“Foi a última grande greve de trabalhadores de 1968. Somente dez anos depois, em 1978, com a paralisação da Scania, em São Bernardo do Campo (SP), o movimento operário voltaria a realizar mobilizações expressivas.”
É necessário corrigir-se esta afirmação. Em abril de 1968, os metalúrgicos de Contagem paralisaram suas atividades durante três dias e, nos primeiros dias de outubro, os bancários, notadamente no Estado do Paraná, realizaram a última greve daquele ano e que, registre-se, foi parcialmente vitoriosa, pois conquistaram reajuste salarial acima do teto pré-estabelecido com base no PAEG – Plano de Ação Econômica do Governo, a política econômica imposta pelas forças civis/militares ditatoriais para enriquecer os mais ricos e empobrecer os mais desfavorecidos.
Portanto, a última greve proletária de 1968 ocorreu em outubro, a contrariar os apontamentos registrados pelo Memorial da Democracia. Esses fatos podem ser confirmados com um simples olhar analítico sobre os movimentos dos trabalhadores naquele ano, seja em livros sobre a época, seja até em documentos referidos até mesmo no Google.
Em São Paulo, para além da sua importância enquanto centro da economia nacional, os metalúrgicos de Osasco promoveram em julho de 1968 greve contra a política de arrocho salarial implantada pela ditadura militar; e teve, exatamente por isso, maior repercussão.
Quando a sirene soou às 9h00 horas do dia 16, os operários da Cobrasma anunciam a greve e a ocupação da fábrica. O movimento ampliou-se rapidamente e de forma solidária foram paradas as máquinas da Braseixos, Lonaflex, Barreto Keller, Fósforos Granada e Brown Boveri. O confronto operou-se com forças do Exército e a violência conduziu à prisão cerca de 400 operários.
Na comemoração realizada em São Paulo no último final de semana estavam presentes vários participantes daquele movimento; afinal, somos crias de nossas almas e de nossas memórias. E no marco das recordações, receberam a justa homenagem aqueles cuja bravura levou-os aos combates de 1968 e ainda os mantém entrincheirados até hoje, seja na galeria dos imprescindíveis, seja agora nas lutas contra os golpistas que usurpam do Palácio do Planalto desde maio de 2016.
Um dos operários emocionado disse: “Não gosto que o chamem Zequinha Barreto. Ele era o nosso BARRETÃO”.
A distância do tempo é uma ironia cuja passagem não se abate a machado.
(*) Maria Fernanda Arruda é escritora e midiativista