Opinião

Manlio Dinucci: A Itália na coalizão ‘antiterrorismo’

20/11/2019

Em artigo no jornal Il Manifesto, o jornalista Manlio Dinucci comenta o envolvimento da Itália na “Coalizão global contra o Estado Islâmico”. O chamado Estado Islâmico é a mesma organização terrorista que contou com o apoio dos EUA, Turquia, Arábia Saudita, Catar, Jordânia e outros países

O ministro das Relações Exteriores Luigi Di Maio, acolhendo em Roma cinco militares feridos no Iraque, declarou que “o Estado italiano jamais recuará um centímetro em face da ameaça terrorista e reagirá com toda a sua força diante daqueles que semeiam o terror”. Em seguida, voou para Washington a fim de participar da reunião do grupo restrito da “Coalizão global contra o Estado Islâmico”, da qual faz parte, sob a condução dos EUA, Turquia, Arábia Saudita, Catar, Jordânia e outros países que apoiaram o grupo Estado Islâmico e formações terroristas semelhantes fornecendo-lhes armas e treinamento (como nós documentamos neste jornal).

A coalizão – da qual fazem parte a Otan, a União Europeia, a Liga Árabe, a Comunidade dos Estados do Sahel/Saara e a Interpol, mais 76 países separadamente – reivindica em seu comunicado de 14 de novembro último ter libertado o Iraque e o Nordeste da Síria do controle do Estado Islâmico”, quando é evidente que as forças da coalizão tinham deixado voluntariamente as mãos livres ao Estado Islâmico.

Esta formação terrorista e algumas outras foram batidas somente quando a Rússia interveio militarmente em apoio às forças governamentais sírias. A coalizão reivindica também ter “fornecido 20 bilhões de dólares em assistência humanitária e para a estabilização aos povos iraquiano e sírio, e treinado e equipado mais de 220 mil membros das forças de segurança para estabilizar as comunidades locais”. O objetivo dessa “assistência” é na realidade não a estabilização mas a contínua desestabilização do Iraque e da Síria, apoiando-se instrumentalmente sobre os diversos componentes do movimento curdo pela independência, para desagregar esses Estados nacionais, controlar seus territórios e reservas energéticas.

No quadro dessa estratégia, a Itália, definida como “um dos maiores contribuintes da coalizão”, está engajada no Iraque principalmente no treinamento das “forças de segurança curdas” (Peshmerga), notadamente na utilização de armas antitanque, morteiros e artilharia, e de fuzis de precisão nos cursos especiais para atiradores de elite. Atualmente, operam no Iraque cerca de 1.100 militares italianos, divididos em diversos destacamentos em diferentes lugares, dotados de mais de 300 veículos terrestres e 12 aéreos, gerando uma despesa de 166 milhões de euros em 2019.

Ao lado daquela que está no Iraque, encontra-se uma componente aérea italiana no Kuweit, com quatro caças-bombardeiros Typhoon, três drones Predator e um avião tanque para abastecimento em em voo. Segundo toda probabilidade, as forças especiais italianas, às quais pertencem os cinco feridos, participam de ações de combate mesmo que sua missão oficial seja apenas de treinamento. O emprego das forças especiais em si é secreto. Ele se torna agora mais secreto porque seu comando, o Comfose, foi transferido do quartel de La Folgore em Pisa para a área limítrofe da base de Camp Darby, o maior arsenal dos USA fora da pátria-mãe, onde se desenvolvem também as atividades de treinamento.

Na coalizão a Itália tem também a missão de dirigir em conjunto com a Arábia Saudita e os Estados Unidos o “Grupo financeiro de oposição ao Estado Islâmico”. Ou seja, aqueles que financiaram e organizaram o armamento das forças do Estado Islâmico (conforme investigação do New York Times em 2013).

Com todos esses méritos, o ministro das Relações Exteriores Di Maio lançou em Washington a proposta, imediatamente aceita, de que a Itália receba a reunião plenária da coalizão em 2020. A Itália terá também a honra de acolher infatigáveis oponentes ao terrorismo como a Arábia Saudita que, depois de ter financiado o Estado Islâmico, gasta agora seus petrodólares para financiar sua guerra terrorista no Iêmen.

(*) Jornalista e geógrafo. Artigo publicado originalmente em Il Manifesto. Tradução de José Reinado Carvalho, editor de Resistência

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