Europa
Macron acena a Merkel e ameaça a Síria
O novo presidente francês promete o reforço do diretório franco-alemão e admite atacar sozinho a Síria. Novo governo, que tomou posse com polêmica, é dominado pelos velhos interesses e terá frente dupla na oposição à esquerda.
Emmanuel Macron deu, nesta quarta-feira (21), a vários órgãos de comunicação social europeus, a sua primeira grande entrevista. A partir dos jardins do Palácio do Eliseu, o presidente francês elogiou as “reformas estruturais” que a Alemanha realizou “nos últimos quinze anos”, defendendo que é esse o caminho, também, para o seu país.
Para Macron, a União Europeia deve “recuperar a confiança” dos cidadãos sob a batuta da sua França e da Alemanha de Merkel.
A sua eleição para a presidência e a conquista da maioria absoluta dos deputados (com menos de 30% dos votos no primeiro turno das eleições legislativas) pelo partido que criou, “A República em Marcha!”, foi caracterizado por ele como “um renascimento da França, e espero que (também) da Europa”.
Macron afirma que os resultados das legislativas (que tiveram o segundo turno no domingo passado) representam o culminar do “colapso dos partidos tradicionais franceses”. Os partidos que governaram a França nas últimas décadas (Partido Socialista, PS, e a direita gaullista, hoje “Os Republicanos”) foram duramente penalizados: em conjunto, perderam 379 deputados (em 577 parlamentares).
Velhos governantes com nova roupagem cooptados para o executivo
No entanto, nem a aritmética nem o governo ontem nomeado por Macron confirmam as afirmações do ex-banqueiro. A sua “Marcha!” conseguiu 308 lugares, uma das mais curtas maiorias dos últimos 20 anos; um olhar mais cuidado à composição do grupo parlamentar e do governo mostra que o nome pode ter mudado mas as caras não.
Se o próprio Emmanuel Macron não fosse exemplo disso mesmo – enquanto ex-ministro da Economia do último governo do PS, com François Hollande –, o primeiro-ministro Édouard Philipe dissipa quaisquer dúvidas, não fosse ele um destacado representante da direita gaullista.
Sintomaticamente, uma das prioridades do novo poder, assumida por Macron na campanha para as presidenciais, é mais uma revisão às leis trabalhistas. Para a tutela do Trabalho, a escolha recaiu sobre Muriel Pénicaud, que, desde 2002, passou pela administração de empresas como a Dassault Systémes, a Danone, a SNCF (caminhos de ferro), a Orange (telecomunicações) ou a Aeroportos de Paris. A partir de Janeiro de 2015, assumiu a direção-geral da Business France, agência de apoio ao investimento e à internacionalização das empresas.
A máquina que ainda não arrancou mas já perde peças
O governo nomeado na quarta-feira conta com várias baixas em relação ao que foi empossado após as eleições presidenciais, nomeadamente a ausência de qualquer membro do MoDem – o segundo partido da “maioria presidencial”. No início da semana caíram Sylvie Goulard e Richard Ferrand, ambos sob suspeita de corrupção. Ontem, foram François Bayrou, líder do partido, e Marielle de Sarnez, que assumirá a liderança do grupo parlamentar, a pedir para ficar de fora do novo executivo de Philipe. O MoDem, com apenas 4% na primeira volta, elegeu 42 deputados no domingo, fruto da aliança com o “Em Marcha!” de Macron.
PCF e FI prometem “convergência” e “frente dupla” no combate a Macron
A Assembleia Nacional terá dois grupos parlamentares na oposição ao governo de Macron, à esquerda do PS. O Partido Comunista Francês (PCF), com 11 deputados eleitos, anunciou ontem que vai formar um grupo com quatro deputados oriundos dos territórios ultramarinos. A França Insubmissa (FI), do candidato presidencial Jean-Luc Mélenchon, formará o outro grupo parlamentar, com 16 deputados.
Em conferência de imprensa, também nesta quarta-feira, o deputado comunista André Chassaigne afirmou que entre as duas formações parlamentares haverá “não divergência, mas convergência”. A ideia foi partilhada por Mélenchon à entrada no Palácio Bourbon, onde está instalada a Assembleia Nacional, informava o L’Humanité.
A decisão foi saudada pela presidente do grupo “Comunistas, Republicanos e Cidadãos” no Senado, Eliane Assassi. A formação dos dois grupos vai permitir “duplicar” a frente de combate às políticas de Macron, defendem várias figuras da esquerda francesa.
Macron admite ataque na Síria, “mesmo que a França atue sozinha”
Em matéria de política externa, o presidente francês decidiu ontem transmitir uma mensagem de força. Não para com a União Europeia (UE), que deseja aprofundar; nem para com o Reino Unido, cuja decisão de saída da UE quer ajudar a reverter; tampouco para com os EUA e Donald Trump, apesar das críticas à saída do Acordo de Paris sobre alterações climáticas, anunciada pelo presidente norte-americano.
A grande promessa da “nova” política externa francesa foi anunciada por Macron com firmeza: está disposto a bombardear a Síria, sozinho se preciso, caso sejam ultrapassadas as “linhas vermelhas” que o próprio traçou. A saber, a utilização de armas químicas ou o desrespeito dos corredores humanitários, sem que diga por quem nem que alvos irá atacar.
A entrevista ao presidente francês foi conduzida por jornalistas de oito jornais europeus: Le Figaro, Le Temps, Le Soir (França), El País (Espanha), The Guardian (Reino Unido), Corriere della Serra (Itália), Süddeutsche Zeitung (Alemanha) e Gazeta Wyborcza (Polônia).
Fonte: AbrilAbril