Portugal
Incêndios em Portugal: Tragédia e disputa política
O número de mortos nos incêndios que atingiram o centro e o norte de Portugal no domingo (15) subiu para 42 com a morte de uma mulher que estava no Hospital de Coimbra. Segunda a agência Efe a informação foi confirmada nesta quarta-feira (18) pela porta-voz da Autoridade Nacional de Proteção Civil (ANPC), Patrícia Gaspar, elevando o último balanço oficial de vítimas divulgado na terça. O número de feridos chega a cerca de 70. A tragédia acirrou a disputa política na Assembleia da República que inclusive discutirá, na próxima semana, uma moção de censura contra o governo do Partido Socialista (PS).
Os mais de 700 focos de incêndio registrados no domingo e na segunda-feira foram controlados apenas na terça-feira graças à queda das temperaturas e à chegada das chuvas em Portugal.
Essa é a segunda crise similar vivida por Portugal neste ano. Em junho, 64 pessoas morreram e mais de 250 ficaram feridas no grande incêndio de Pedrógão Grande.
Ataque da direita
Os incêndios já fizeram sua primeira vítima política. A ministra de Administração Interna, Constança Urbano de Souza, apresentou sua demissão nesta quarta-feira ao primeiro-ministro do país, António Costa, do PS.
Na terça-feira (17) o presidente conservador, Marcelo Rebelo de Sousa, aproveitou para criticar duramente o governo do primeiro-ministro e destacou que era preciso “abrir um novo ciclo” no governo. Em Portugal é possível, como atualmente, a existência de um presidente não alinhado politicamente ao primeiro-ministro, que detém as mais importantes funções executivas e que governa de fato. No mesmo dia em que o presidente neoliberal deu o sinal do ataque, o partido direitista CDS anunciou que apresentará nesta quinta-feira (19) uma moção de censura ao governo. Pelo regimento do parlamento português, isso significa que a moção será debatida e votada na próxima terça-feira (24) ou quarta (25). Caso a moção seja aprovada, o que é bastante improvável pela atual correlação de forças na Assembleia da República, isso significaria a queda do governo do Partido Socialista.
A posição do PCP
Também na terça-feira o Partido Comunista Português (PCP) divulgou uma nota de imprensa onde afirma que “a dimensão da tragédia traduz dramaticamente os problemas da floresta acumulados por décadas de política de direita de governos PSD, CDS e PS. A dimensão da tragédia exige a adoção de medidas imediatas e políticas de fundo que deem resposta a esses problemas e não que eles sejam utilizados como pretexto para manobras parlamentares que visam apenas objetivos políticos e partidários.”
Nesta quarta-feira, o presidente do grupo parlamentar comunista na Assembleia da República (15 deputados), João Oliveira, corroborou este entendimento e acrescentou que “sem prejuízo do aperfeiçoamento legislativo que é possível fazer, os problemas da floresta não dependem de alterações legislativas mas sim de investimento público, da locação de meios do estado aos objetivos não só do ordenamento da floresta, da prevenção e do combate aos fogos florestais, do apoio às atividades econômicas para que possam ser sustentáveis, bem como do combate à desertificação do interior do país.”
Por coincidência, nesta mesma quarta-feira ocorreu o debate quinzenal com o primeiro-ministro, António Costa, na Assembleia da República. Na oportunidade, o Secretário-Geral do PCP e deputado, Jerónimo de Sousa, iniciou seu discurso transmitindo “às vítimas e às suas famílias a nossa mais viva solidariedade” e em seguida denunciou: “estamos a pagar a pesada fatura de décadas de política de direita. No mundo rural, na agricultura, na floresta, no abandono do interior. A desertificação econômica e humana de vastos territórios, pela liquidação de milhares de explorações agroflorestais; a falta de rentabilidade econômica e a desenfreada expansão do eucalipto; o desordenamento florestal e a falta de cumprimento mínimo da Estratégia Nacional das Florestas e do Sistema Nacional de Defesa da Floresta Contra Incêndios, não são fruto do acaso. São a pesada fatura dessas políticas.” E cobrou de António Costa: “Regresso à questão que lhe pus em julho: está disposto a gastar na Floresta e na agricultura familiar tanto como o Estado gastou na salvação do Banif?”.
Banif é a sigla de um banco privado (Banco Internacional do Funchal S.A.) salvo pelo Estado português com centenas de milhões de euros de dinheiro público. Vale a pena ver a baixo o vídeo com a íntegra da intervenção de Jerónimo Souza, que, depois de cobrar do governo transparência e compromissos concretos quanto à questão dos incêndios, finalizou seu discurso mais uma vez fazendo referência às vítimas: “Senhor Primeiro-Ministro, está na disposição de, ainda na fase do debate do Orçamento do Estado, assumir essa clareza e esses compromissos, mesmo à custa das metas do déficit (público) definidas e desfasadas das necessidades e realidades do País? As pessoas têm que estar primeiro que o déficit! Se assim for, estaremos a prestar a melhor homenagem aos que perderam a vida, os seus bens, a sua habitação, a sua empresa e a sua produção.”
Wevergton Brito Lima, da Redação do Resistência