Opinião

G7 faz a cúpula do declínio, da provocação, insegurança e ameaças de guerra

16/06/2024
Italy's Prime Minister Giorgia Meloni, U.S. President Joe Biden, France's President Emmanuel Macron, Canada's Prime Minister Justin Trudeau, Germany's Chancellor Olaf Scholz, Britain's Prime Minister Rishi Sunak, Japan's Prime Minister Fumio Kishida, European Commission President Ursula von der Leyen and President of the European Council Charles Michel pose for a family photo on the first day of the G7 summit at the Borgo Egnazia resort, in Savelletri, Italy June 13, 2024. REUTERS/Guglielmo Mangiapane

Já se foi o tempo em que o G7 tomava decisões que definiam o rumo dos acontecimentos mundiais, escreve o dirigente comunista José Reinaldo Carvalho 

Por José Reinaldo Carvalho (*) – A cúpula do G7, realizada na Itália nestas quinta (13) e sexta-feira, apresentada como a reunião das mais ricas potências “democráticas” é um acontecimento que se destaca apenas por sua irrelevância. Já se foi o tempo em que esse grupo tomava decisões que definiam o rumo dos acontecimentos, como se fossem ordens executivas de um diretório capaz de fazer valer ditames. Era o tempo em que o poder desses países se expressava também pelo número de nações governadas por sobas de províncias, satrapias, espécies de vice-reinados em vilipêndio da autodeterminação e dos direitos de seus povos. 

Hoje dessa época resta apenas uma pálida lembrança que permanece para ressaltar que estamos em presença do franco e vertiginoso declínio do mundo unipolar. O mundo do G7 está finando. Não têm valor, crédito nem apoio as iniciativas que seus líderes esboçam para afiançar seu tipo de multilateralismo, que nada tem a ver com o direito internacional e o direito internacional humanitário, substituído que foram pela falácia da “ordem internacional baseada em regras”. Enquanto os líderes do G7 tentam projetar uma imagem de unidade e força, a realidade interna e externa sugere um panorama muito mais complexo e desafiador. A imagem de um passado distante de um G7 robusto e coeso é cada vez mais apagada pela nova realidade em que outras potências emergentes e blocos geopolíticos alternativos se tornam o polo dinâmico da economia e da geopolítica.  A China e a Rússia, por meio da Organização para a Cooperação de Xangai e do BRICS, estão construindo uma nova ordem mundial, afastando-se da hegemonia do imperialismo estadunidense e seus parceiros da Otan e União Europeia. Este polo não apenas ganha força, mas também atrai a atenção e a aliança de várias nações do Sul Global, que buscam uma representação mais justa e equitativa no cenário internacional.

A realidade interna e externa desses países sugere um panorama muito mais complexo e desafiador. Para além do declínio histórico, os principais líderes reunidos em Apulia, Itália, à exceção da primeira-ministra anfitriã, Georgia Meloni, enfrentam neste momento crises internas significativas. Joe Biden, nos Estados Unidos, consome-se, cada vez mais estafermo, em uma dura batalha para a reeleição em meio a uma polarização política sem precedentes. Rishi Sunak, no Reino Unido, parece destinado a perder o poder na próxima eleição nacional. Emmanuel Macron, na França, sofreu uma acachapante derrota nas eleições europeias. Dissolveu o parlamento, convocou eleições antecipadas e corre o risco de que o período restante de seu mandato presidencial seja marcado por uma inaudita vulnerabilidade, na condição de terceira força política, atrás da extrema direita e da esquerda unida da Nova Frente Popular. Olaf Scholz, na Alemanha, também foi escorraçado pelas urnas. 

É nesse contexto que o G7 se lança a empreitadas que geram apenas mais tensão internacional. A primeira decisão da cúpula, na presença do ditador ucraniano Vladimir Zelensky, foi fornecer 50 bilhões de dólares em empréstimos para a Ucrânia, utilizando juros de ativos soberanos russos bloqueados. A decisão foi tomada em paralelo à assinatura de um novo acordo de segurança de longo prazo (10 anos) com os EUA. O plano do G7 para a Ucrânia é baseado em um empréstimo de vários anos usando lucros de cerca de 300 bilhões de dólares de fundos russos confiscados, a maior parte dos quais está bloqueada na União Europeia. Biden liderou a provocação contra Rússia bradando que tais acordos constituem “mais um lembrete para Putin de que não vamos recuar.”

Essas decisões agravam as tensões e aumentam o perigo de uma confrontação direta dos seus patrocinadores com a Rússia. Não se trata de um gesto normal de apoio financeiro de um bloco de países a um aliado em condições de normalidade, mas de uma ação de salteadores. Não à toa a Rússia reagiu energicamente, afirmando que as potências imperialistas reunidas na Itália praticaram uma ação criminosa. Prometeu retaliar e disse que a resposta será dolorosa. 

Vê-se que essas potências decidiram exacerbar o clima de tensão, o que aumenta a  insegurança global, deixando o mundo mais distante da paz e da estabilidade.

O confisco de ativos soberanos sem o devido processo cria um precedente perigoso no direito internacional. Se estas ações forem vistas como aceitáveis, abre-se um precedente pelo qual qualquer país pode justificar a apropriação de ativos estrangeiros sob pretextos políticos, desestabilizando ainda mais o sistema financeiro global. Esta medida não apenas atinge a Rússia, mas também alerta outras nações sobre a insegurança de seus próprios investimentos internacionais. Um efeito colateral dessas medidas, em desfavor do próprio G7 é que os países emergentes do Sul Global podem se afastar ainda mais dessas potências, em busca de novas oportunidades de desenvolvimento e cooperação. Países na África, América Latina e Ásia estão cada vez mais alinhados com iniciativas que promovem crescimento inclusivo e sustentável, muitas vezes encontrando parceiros mais dispostos e menos impositivos fora do eixo tradicional do G7.

Ao invés de buscar soluções diplomáticas para o conflito na Ucrânia, o G7 optou por uma abordagem que poderia levar a uma escalada militar. O acordo de segurança a longo prazo entre os Estados Unidos e a Ucrânia, além do fornecimento contínuo de armamentos e suporte militar, solidifica a linha de confronto com a Rússia. Este tipo de apoio não apenas prolonga o conflito, mas também aumenta o risco de uma guerra em larga escala, que poderia facilmente se espalhar para outras regiões e envolver diretamente as potências nucleares.

Em um momento em que a cooperação e a paz são mais necessárias do que nunca, o G7 escolheu o caminho da provocação e da insegurança. Este encontro, longe de representar um passo em direção a um futuro mais estável e próspero, consolida ainda mais as ameaças de guerra. As decisões tomadas não apenas prejudicam a estabilidade global, mas também criam precedentes perigosos que podem levar a uma era de maior incerteza e perigo. 

Na ordem do dia dos líderes da potências imperialistas ocidentais constam também pressões sobre o Hamas para capitular perante os genocidas como condição preliminar para o cessar-fogo e medidas estratégicas relacionadas com a região do Indo-Pacífico, prenunciando ações que vão, mais dia, menos dia, confrontá-las com a China. 

(*) Jornalista, editor do Resistência, membro do Comitê Central e da CVomissão Política Nacional do Partido Comunista do Brasil, onde exerce a função de coordenador do setor de Solidariedade e Paz. É presidente do Cebrapaz – Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz 

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