História

Conheça o legado de Ali Shariati, ideólogo da revolução iraniana

11/02/2022

Neste 43.º aniversário da República iraniana, a República Islâmica sentirá a necessidade de revisitar o pensamento de Ali Shariati

Por Leonardo Sobreira (*), no Brasil 247 No 43.º aniversário da Revolução Iraniana, o pensamento do sociólogo Ali Shariati permanece central para a compreensão do movimento revolucionário iraniano como um todo. Sua morte, em 1977, dois anos antes da consumação da luta contra o regime ditatorial de Mohammed Reza Shah Pahlavi, veio no momento em que ele era um dos autores mais lidos do Irã. Desde então, diversas tendências políticas exploraram o pensamento do sociólogo. 

Vida

Ali Shariati nasceu em um vilarejo próximo a Mashad, em 23 de novembro de 1933. Seus ancestrais eram teólogos respeitados e seu pai, Muhammad Taqi Shariati, foi um notável estudioso da exegese islâmica. 

O jovem Ali Shariati estudou em colégios modernos, tendo ingressado no Teachers Training College, na nova Universidade de Mashad e, por fim, na Sorbonne, em Paris, por meio de uma bolsa governamental. 

Durante seus estudos na capital francesa, Ali Shariati colaborou com a Frente de Libertação Nacional da Argélia, em 1959. Ele também traduziu textos de Frantz Fanon, com quem ele manteve correspondência, desafiando o intelectual de Martinica sobre a relação entre religião e revolução. 

Segundo Fanon, os povos dominados teriam que abrir mão de suas próprias religiões para travar uma luta vitoriosa contra o imperialismo. Ao contrário dele, Shariati enxergava que os povos não poderiam lutar contra o imperialismo a menos que primeiro recuperassem sua verdadeira identidade cultural, composta, em muitos casos, pela religião.

Em 1965, Shariati voltou ao Irã, onde, logo ao desembarcar, foi preso pelo regime ditatorial. Tendo passado seis meses na prisão, foi libertado e deu aulas numa escola de vilarejo, antes de retornar à Universidade de Mashad.

Em 1967, conseguiu se mudar para Teerã, onde assumiu um cargo de professor no Husseinieh-e Ershad, um grupo estabelecido por comerciantes ricos e líderes veteranos do Movimento de Libertação que sediava discussões religiosas. Os próximos cinco anos foram os mais produtivos de sua vida, foi quando converteu suas palestras em cerca de 50 livretos.

O grupo foi fechado pela polícia secreta do regime ditatorial em 1972, diante da suspeita de ligações com guerrilheiros do Mujaheddin-e-Khalq, e Ali Shariati foi preso. 18 meses depois, foi solto sob a condição de vigilância constante do regime. 

Em 1977, as autoridades iranianas concederam a Ali Shariati permissão para exílio no exterior. Ele acabou indo para o Reino Unido, mas seu verdadeiro desejo era ir para os Estados Unidos. Morreu um mês após a chegada em Londres, em decorrência do que as autoridades britânicas classificaram como um “ataque cardíaco”. Seus apoiadores foram além e apontaram, em protestos, envolvimento das forças secretas iranianas. 

Como os protestos já indicavam, as contribuições de Ali Shariati permaneceriam vivas por muito tempo, tendo inspirado o movimento revolucionário em suas diversas alas. Dois anos depois, em 1979, o regime Pahlavi foi derrotado e uma nova República Islâmica erguida.

Legado

A herança intelectual de Ali Shariati é disputada por diversos grupos ideológicos que atuaram na Revolução, e que, atualmente, são rivais políticos. Os religiosos do Partido Republicano Islâmico citam seu trabalho nas áreas de origens do xiismo, revoluções culturais, deficiências dos movimentos comunistas e a necessidade de lutar contra o imperialismo estrangeiro, mas o censuram quando se trata das críticas à forma tradicional de conduzir o ulama (grupo de guardiões estudiosos da religião). Já os Mujaheddin o veem como um ideólogo da revolução social, e alguns de seus admiradores entraram para o grupo e-Khalq.

Neste 43.º aniversário da República Islâmica, a República Islâmica regime sentirá a necessidade de revisitar o pensamento de Ali Shariati no tocante à necessidade de consolidar a revolução anti-imperialista; conter a possibilidade de uma contra-revolução; e, por fim, fortalecer a mística que ainda envolve Aiatolá Khomeini e seus sucessores e influencia grandes segmentos da população. A síntese elaborada por Shariati entre o Islã Xiita, o marxismo e o nacionalismo, é original e extremamente sintonizada com o momento histórico atravessado pelo Irã no final da década de 1970 até os dias atuais.

(*) Jornalista e cientista social

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