Opinião

2018: O ano de todos os perigos

22/02/2018

E há eleições e eleições. Democráticas, pelo visto, só aquelas em que ganhem candidatos aprovados em Langley. Este ano será atarefado para o Pentágono.

Por Bruno Carvalho

Demitiu-se o ministro holandês dos Negócios Estrangeiros por inventar uma suposta reunião que teria tido com Vladimir Putin onde o presidente russo lhe havia exposto as intenções de expandir territorialmente o seu país (1).

Esta mentira, que era apenas mais um episódio na atual campanha de acusações contra Moscou sobre manipulação de eleições, contrasta com a notícia que acaba de ser veiculada pelo The New York Times.

Desde que a CIA foi fundada, em 1947, os Estados Unidos interferiram em mais de 80 processos eleitorais noutros países.

“Malas cheias de dinheiro entregues num hotel em Roma para favorecer candidatos italianos. Fugas de informação de escândalos em jornais estrangeiros para mudar uma eleição na Nicarágua. Milhões de panfletos, cartazes e adesivos impressos para derrotar um responsável político na Sérvia”, é assim que começa o artigo do jornal norte-americano. Ainda segundo a publicação, Washington interferiu nas eleições russas de 1996 para derrotar o candidato comunista Gennadi Ziuganov e dar a vitória a Boris Ieltsin.

Se Madrid se chamasse Ancara, e Moscou fosse Bogotá…

Na mesma semana em que o Tribunal Europeu de Direitos Humanos condenou o Estado espanhol a indenizar com 50 mil euros dois membros da ETA que acabaram no hospital depois de serem torturados, Madrid continua a apontar Moscou como responsável por dar oxigênio aos independentismo basco e catalão. Não há uma única palavra sobre haver várias centenas de presos por motivos políticos nos cárceres espanhóis, desde músicos condenados pelas suas letras a internautas acusados de escreverem posts ofensivos no twitter.

Se Madrid se chamasse Ancara e se Rajoy fosse Erdogan não faltariam páginas nos jornais para denunciar tamanhos atentados à democracia. Numa dezena de anos, os sucessivos governos espanhóis pediram a ilegalização de dezenas de partidos sob a acusação de serem apologistas do terrorismo. Os tribunais dos quais o franquismo nunca foi saneado acederam à prisão de candidatos, de sindicalistas, de jornalistas, de estudantes e ao encerramento de rádios e jornais. Acumulam-se centenas de denúncias de tortura. De gente que nunca havia pegado numa pistola na sua vida.

Se Moscou fosse Bogotá, veríamos as televisões escandalizadas com uma campanha eleitoral em que são assassinados diariamente militantes de esquerda, sindicalistas, camponeses e indígenas num país que viu serem assassinados, nas últimas décadas, os candidatos presidenciais Jaime Pardo LealLuís Carlos GalánBernardo JaramilloCarlos Pizarro.

A CIA sem mãos a medir

Este ano, o quartel-general da CIA em Langley não deve ter mãos a medir. Para além das eleições na Rússia e na Itália, a Venezuela, a Colômbia e o Brasil vão estar no vórtice plebiscitário.

Que a oposição em Caracas tenha rejeitado participar nas presidenciais, a par das declarações bélicas dos responsáveis norte-americanos, pode fazer prever o recurso a uma intervenção militar para esmagar o chavismo. Só o recurso a forças militares estrangeiras pode dar à oposição aquilo que as sucessivas eleições, terrorismo de baixa intensidade e um golpe fascista derrotado, em 2002, não conseguiram. A aliança cívico-militar é um muro de contenção anti-imperialista.

Por outro lado, a Colômbia, que tem sete bases norte-americanas no seu território, não tem agora de gastar parte dos seus recursos no combate às FARC. Um dado que não é de somenos importância nas forças armadas de um país que tinha mais soldados abatidos pela guerrilha que as tropas ocupantes no Afeganistão e no Iraque.

A isto, há que acrescentar o alinhamento do golpismo brasileiro com os interesses de Washington, a vitória de Sebastián Piñera no Chile e a traição de Lenin Moreno no Equador.

(1.) Vale a pena consultar o jornal holandês cuja investigação obrigou o ministro a reconhecer, a contragosto, que mentira (De Volkskrant, ver Natalie Righton, «O castelo no ar de Halbe Zijlstra’s colapsou lentamente», 16/02/2018) e comparar com a forma como as agências (Reuters e Deutsche Welle, por exemplo) trataram o caso

Fonte: AbrilAbril

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