Entrevista
O Irã está preparado para cooperar com outros países regionais a fim de alcançar a paz duradoura no Oriente Médio, diz embaixador
Hossein Gharib, embaixador do Irã no Brasil, analisa em entrevista (*) os conflitos no Oriente Médio, comenta sobre as sanções unilaterais e as boas relações com o Brasil
Resistência – Qual o papel do Irã no Oriente Médio, especialmente no contexto de conflitos regionais? Qual é a posição do país em relação a questões como a guerra em curso dos sionistas israelenses contra o povo palestino?
Hossein Gharibi – A região do Oriente Médio tem sofrido vários problemas devido às intervenções históricas de potências estrangeiras. A última delas foram as guerras no Afeganistão e no Iraque, bem como o terrorismo. Embora a segurança da região seja vital para nós, o Irã tentou restaurar a paz, a segurança e a ordem em toda a região e ser a principal força de contraterrorismo. Se não fosse o Irã a combater os terroristas do ISIS (o chamado Estado Islâmico, N.R) vindos do norte do Iraque em direção ao sul e à capital Bagdá, todo o mapa da região pareceria diferente hoje. Acreditamos que através da cooperação dos países regionais sem intervenção estrangeira das grandes potências podemos contribuir para o desenvolvimento econômico, a paz e a segurança de toda a região. A recente aproximação entre o Irã e a Arábia Saudita e os bons diálogos que estão a decorrer são um bom exemplo de criação de confiança entre os intervenientes regionais, podemos obter resultados duradouros.
O regime sionista, desde o seu início, travou guerras contra os palestinos locais e outras nações da região, incluindo os habitantes cristãos de Jerusalém e da Palestina. Já se passaram 75 anos e não houve nenhum dia calmo durante esta longa história. Os recentes incidentes em Gaza são apenas um pequeno período desta longa história de opressão e sofrimento. Até que a ocupação e os crimes contra os palestinos não terminem, a paz duradoura estará fora de alcance. As pessoas estão sob ataques selvagens e toda a comunidade internacional tem deveres a este respeito. O Irã está preparado para cooperar com outros países regionais, a fim de alcançar esse objetivo.
Resistência – Qual será a reação do Irã à intensificação da agressão dos sionistas israelenses ao povo palestino caso haja invasão terrestre na Faixa de Gaza ?
Hossein Gharibi – Milhares de pessoas foram brutalmente mortas e massacradas em Gaza e esta situação deve ser interrompida imediatamente. As pessoas não podem simplesmente esperar e ver tais atrocidades no século XXI. A intenção desse regime é exterminar o povo palestino e cometer um genocídio generalizado em Gaza. Todos os que têm capacidade para impedir esta matança generalizada de pessoas inocentes devem fazer o seu melhor para a impedir.
Resistência – Como o Irã vê seu papel no cenário internacional atual e quais são suas prioridades em termos de relações diplomáticas com outros países?
Hossein Gharibi – Desde o início desta agressão, tanto o presidente iraniano como o ministro dos Negócios Estrangeiros têm estado em contato estreito com os seus homólogos na região e fora dela, a fim de acalmar o conflito e ajudar os habitantes de Gaza a serem protegidos de tais agressões. Na semana passada houve uma conversa telefônica entre o presidente Raisi e o presidente Lula e o tema principal foi proteger o povo palestino, incluindo mulheres e crianças, dos constantes bombardeios do exército israelense. Esperamos que, com a cooperação de todas as nações amantes da paz, haja medidas fortes para proteger as pessoas em Gaza.
Resistência – Como o Irã avalia a situação do acordo nuclear e quais são suas expectativas para as negociações em curso? Como as sanções internacionais têm impactado o país e quais são as estratégias para mitigar esses efeitos?
Hossein Gharibi – Chegamos a um entendimento sobre um acordo denominado JCPOA (sigla em inglês do Plano de Ação Conjunto Global) em 2015. Também foi adotado pela resolução 2231 do Conselho de Segurança da ONU. Trump retirou os EUA do acordo e violou a resolução da ONU. O Irã tem insistido, desde o início, que a parte que violou o acordo deveria cumprir completa e verificavelmente os seus compromissos. Honrar os compromissos de todas as partes do JCPOA criará um ambiente mais favorável para todos. Parece lamentável que a administração Biden ainda não tenha decidido cumprir as obrigações dos EUA ao abrigo da resolução da ONU.
Ao mesmo tempo, era uma expectativa legítima que os países europeus agissem de forma mais responsável em relação a um acordo em que também faziam parte. Eles não fizeram quase nada e, exceto algumas declarações iniciais, aparentemente estavam com os EUA, violando a Resolução 2231 da ONU. Agora a bola está do seu lado e sempre que voltarem para defender a sua responsabilidade pelo acordo, certamente encontrarão o Irã como parceiro construtivo. O confronto não serve ao interesse de ninguém. A cooperação de boa fé é do interesse de todos nós num mundo tão frágil.
Resistência – Como o Irã está planejando impulsionar seu desenvolvimento econômico e social nos próximos anos? Quais são as iniciativas-chave que estão sendo implementadas para alcançar esses objetivos e melhorar a qualidade de vida da população?
Hossein Gharibi – O Irã e o Brasil têm muito a compartilhar e trabalhar juntos. As duas economias são complementares por natureza. Em 2022, o nosso comércio direto e indireto ultrapassou os 6,5 bilhões de dólares, mas podemos simplesmente aumentá-lo. Minerais, produtos petroquímicos e produtos de base tecnológica, incluindo equipamentos médicos, são outras áreas além da agricultura que podem fazer enormes diferenças. Recentemente introduzimos alguns de nossos produtos na indústria da saúde no mercado brasileiro. São produtos avançados com preços acessíveis que podem melhorar os serviços de saúde à população.
Mesmas oportunidades para as empresas brasileiras encontrarem novos e grandes mercados no exterior. O Irão é um centro na região que pode ser uma boa base para trabalhar com outros países. Precisamos expandir e diversificar nossos negócios. Ambos os países também têm enormes potenciais no turismo.
(*) Entrevista ao jornalista José Reinaldo Carvalho, editor do Resistência, secretário-geral do Cebrapaz (Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz), membro do Comitê Central e da Comissão Política Nacional do PCdoB, onde coordena o setor de Solidariedade e Paz