América Latina
Morre Tabaré Vázquez: a esquerda latino-americana perde um importante líder
Tabaré Vázquez era um social-democrata progressista e sempre se empenhou para que a Frente Ampla mantivesse o caráter de uma coalizão de esquerda, escreve o jornalista e dirigente comunista José Reinaldo Carvalho
Por José Reinaldo Carvalho (*)
Morreu na madrugada deste domingo, 6 de dezembro, o ex-presidente uruguaio Tabaré Vázquez.
Ele foi o primeiro presidente de esquerda no país vizinho, eleito em 2004 pela Frente Ampla, encerrando 170 anos de domínio das forças conservadoras que se revezavam no poder – os partidos Blanco e Colorado. Antes, em 1989, Tabaré já tinha se projetado no cenário político da esquerda uruguaia e latino-americana elegendo-se prefeito de Montevidéu.
Tabaré foi sucedido na presidência da República por Pepe Mujica, eleito em 2009, e depois voltou a conquistar a presidência, em 2014.
No primeiro governo, Tabaré Vásquez, aplicou políticas pragmáticas e de reformas sociais, num quadro de dificuldades econômicas e financeiras geradas pela desastrosa política de seu antecessor, Jorge Batlle. Preservando a estabilidade financeira, conseguiu combater o desemprego e assegurar a redução da pobreza.
Líder progressista apoiado pelos partidos da Frente Ampla e pelos movimentos sociais, Tabaré Vázquez realizou uma política ativa de defesa dos direitos humanos, buscando esclarecer a verdade sobre os crimes de lesa-humanidade cometidos pela ditadura militar (1973-1985). Essas políticas resultaram em penas de prisão de violadores dos direitos humanos, torturadores e responsáveis pelo desaparecimento e assassinatos de militantes da esquerda.
Vázquez contou com o apoio das forças progressistas e movimentos sociais, mas também causou a insatisfação destes quando vetou “por motivo de consciência”, a lei de desciminalização do aborto, em 2008.
Seu segundo mandato, a partir de 2015, foi marcado, segundo suas palavras, pela “austeridade republicana e a transparência”, que se mesclavam com o compromisso de realizar reformas sociais em nome do aprofundamento da democracia, da soberania nacional e da justiça social.
Foi um entusiasta do Mercosul e da integração latino-americana e aliado dos líderes do ciclo progressista que a região viveu durante a primeira década do século 21, ressalvado um entrevero que teve com a Argentina em 2005-2006. Foi amigo de Lula, Fidel Castro e Hugo Chávez e ajudou a impulsionar políticas progressistas na região. Apoiou o Fórum de São Paulo, de cujas reuniões participou, quando o Uruguai sediou seus encontros.
A relação de Tabaré com os comunistas e líderes revolucionários latino-americanos é um exemplo a ser estudado – assim como a experiência da Frente Ampla – de convergência entre setores que, mantendo sua independência ideológica e de orientação política, perseveram na construção da unidade. Tabaré Vázquez era um social-democrata progressista e sempre se empenhou para que a Frente Ampla mantivesse o caráter de uma coalizão de esquerda.
Tabaré foi o líder máximo da Frente Ampla e ultimamente era seu presidente de honra. A Frente Ampla do Uruguai foi fundada em 1971. O “segredo” da sua acumulação de forças e vitórias políticas e eleitorais radica na unidade das correntes de esquerda, elemento central de sua construção política e organizativa e de sua ligação com as massas populares uruguaias. O partido de frente manteve ao longo de sua trajetória o caráter de força política transformadora, a luta por reformas estruturais democráticas com um programa político que é o oposto do que propõem os partidos das classes dominantes locais e latino-americanas.
Com a morte de Tabaré Vázquez, as forças de esquerda uruguaias e latino-americanas perdem um dos seus importantes líderes.
(*) Jornalista, editor da página Resistência, membro do Comitê Central d eda Comissão Política Nacional do PCdoB