Imigração
Macri endurece lei para restringir migração e agilizar deportações na Argentina
O presidente da Argentina, Mauricio Macri, assinou um decreto que modifica a lei de migrações, aumentando as restrições à entrada e permanência de estrangeiros no país e agilizando o processo de deportação, segundo informações publicadas no Boletim Oficial nesta segunda-feira (30).
O DNU (Decreto de Necessidade e Urgência), elaborado em conjunto pelos Ministérios da Justiça, da Segurança e de Relações Exteriores, a Secretaria de Direitos Humanos e a Direção Nacional de Migrações modificou a atual lei migratória para incluir as “causas impeditivas de entrada e permanência de estrangeiros em território nacional”.
Um dos efeitos da medida será o aceleramento do processo de expulsão de estrangeiros com antecedentes penais, que antes do decreto levava cerca de 6 a 7 anos para ser concluído.
Com as mudanças, os imigrantes que forem notificados de um processo de deportação terão apenas três dias para apresentar um recurso – antes, o prazo era de 30 dias –, ao qual a Justiça deve responder em até três dias. Antes do decreto, o processo de deportação era paralisado até ser obtida uma decisão final, mas, com as mudanças, a expulsão pode ocorrer mesmo sem uma decisão judicial. Após a expulsão, o reingresso ao país é proibido durante cinco anos para delitos culposos e durante oito anos para delitos dolosos.
Fontes oficiais do governo citadas pelo jornal argentino La Nación justificaram o encurtamento dos prazos alegando que os traficantes de pessoas se aproveitavam de brechas legais para evitar os procedimentos de deportação: “Por exemplo, [os traficantes] conseguiam obter a cidadania para a pessoa ingressada ilegalmente, por meio de gestores. Com isso, freavam os trâmites de expulsão: tinham uma margem de tempo suficiente devido à demora do processo”.
Entre as causas para impedir a entrada e a permanência de estrangeiros, independentemente da situação legal de residência, se encontra “ter sido condenado ou estar cumprindo pena, ou ter antecedentes ou penas não firmes” na Argentina ou no exterior por crimes que segundo as leis argentinas mereçam prisão, assim como de tráfico de armas, pessoas, entorpecentes, órgãos e tecidos, ou por lavagem de dinheiro ou investimentos em atividades ilícitas.
O Diário Oficial também inclui pessoas que tenham antecedentes por terrorismo, que tenham participado da promoção com fins lucrativos da entrada ilegal de estrangeiros ou tenham apresentado documentação falsa para obter benefícios migratórios, assim como as que lucrem com a prostituição ou tenham sido condenados ou possuam antecedentes por crimes de corrupção.
Antes das mudanças, apenas aqueles que ainda não tinham regularizado sua situação e haviam sido condenados a uma pena de mais de três anos por delitos graves, como tráfico de drogas, tinham a solicitação de residência negada e eram expulsos do país.
Como exceções, o governo afirma que poderá admitir no país, “unicamente por razões humanitárias, de reunificação familiar ou de auxílio eficaz à Justiça” em determinadas condições, os estrangeiros que se encontrem em alguns desses casos e os que tenham cometido crimes que na Argentina não excedam os três anos de prisão.
Mesmo os imigrantes que já tenham obtido a residência estão sujeitos a terem sua condição de residente revogada em caso de sentenças, firmes ou não, por qualquer delito penalizado com encarceramento. Antes, só deixavam de ter a residência os estrangeiros que, após o cumprimento de pena de cinco anos ou mais, voltassem a cometer um crime nos dois anos seguintes.
Além disso, todo imigrante que estiver com um processo de deportação, mesmo que a decisão não seja firme, poderá ser detido a qualquer momento, algo que antes ocorria somente em casos excepcionais em que a ordem de expulsão fosse firme e consentida.
Em agosto, o governo Macri anunciou a construção em Buenos Aires do primeiro centro de detenção para imigrantes e refugiados que ingressarem ou permanecerem de maneira irregular no país. A medida foi repudiada por juristas e organizações de direitos humanos, que afirmaram que irregularidades migratórias não são motivo de detenção.
Segundo o governo, o número de imigrantes nas prisões do país aumentou nos últimos anos até alcançar 21,35% da população carcerária em 2016 e, em relação aos crimes vinculados ao narcotráfico, 33% dos presos são estrangeiros. Estas e outras questões configuram para o governo “uma situação crítica que pede a adoção de medidas urgentes”.
A Argentina é um dos países da América do Sul com mais ampla tradição migratória. Segundo o último censo nacional, a Argentina possui 4,5% de população estrangeira. Entre os grupos mais representativos estão 30,5% de paraguaios, 19,1% de bolivianos e 8,7% de peruanos.
Organizações sociais contestam reforma migratória
Mais de 130 organizações de migrantes, de direitos humanos, eclesiásticas, acadêmicas e movimentos sociais solicitaram uma reunião urgente com o chefe de gabinete da Argentina, Marcos Peña, diante da reforma da lei migratória.
Em uma carta aberta dirigida à chanceler argentina, Susana Malcorra, e ao secretario de Direitos Humanos, Claudio Avruj, as entidades expressaram “preocupação e desconforto” com a reforma, que consideram “absolutamente infundada”.
A carta também contesta os números divulgados pelo governo, já que, segundo as organizações, menos de 6% da população carcerária na Argentina é de estrangeiros, enquanto a porcentagem de imigrantes no país é de 4,5%. O texto ainda adverte que o discurso de vários funcionários do governo que vincula imigração com delito pode “habilitar episódios de xenofobia e violência contra migrantes”.
A Caref (Comissão Argentina para os Refugiados e Migrantes) indicou que “uma irregularidade administrativa não é um delito”. “Inverteu-se a dinâmica de políticas migratórias. Agora a pessoa tem que demonstrar que sua situação é regular e apressar-se para fazer os trâmites. O Estado não facilita e só aumentaram os controles de permanência, com lógica de perseguir”, expressou a comissão.