Opinião

Lula tem credenciais para influir na solução política da guerra da Ucrânia

24/01/2025

Conversa de Celso Amorim com Wang Yi mostra que Brasil e China desempenham papel mundial de peso, afirma José Reinaldo Carvalho
Por José Reinaldo Carvalho – A recente conversa telefônica entre Wang Yi, ministro das Relações Exteriores da China, e Celso Amorim, assessor especial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, destaca não apenas a relevância da cooperação entre esses dois gigantes do Sul Global, mas também seu potencial transformador no cenário internacional. Com base no consenso alcançado durante a visita de Estado do presidente chinês Xi Jinping ao Brasil, em novembro passado, os dois diplomatas perceberam o quanto é possível vislumbrar um futuro de colaboração estratégica para enfrentar desafios globais, incluindo o conflito na Ucrânia, as desigualdades no desenvolvimento e a crise climática.

São estes os pontos centrais nas atuais disputas geopolíticas, mormente agora, quando o imperialismo estadunidense experimenta uma nova fase agressiva, por meio de uma “diplomacia de força” (uma contradição em termos) e da anunciada hipertrofia do aparato militar.

A reafirmação do plano de paz para a Ucrânia por parte de Amorim e Wang demonstra que o Brasil pode repor em trilhos corretos a diplomacia presidencial, retificando erros cometidos na primeira metade do atual mandato e percorrer novamente o caminho de afirmação do Brasil como uma força de peso no cenário geopolítico.

Vetor para a paz

A troca de opiniões entre Wang e Amorim evidenciou mais uma vez que a cooperação sino-brasileira é um vetor para a paz.

A duração de quase três anos do conflito ucraniano evidencia a urgência de soluções diplomáticas criativas e inclusivas. Nesse contexto, o “consenso de seis pontos” entre Brasil e China e a plataforma “Amigos da Paz” representam uma contribuição significativa para reunir o Sul Global em prol da negociação visando a uma solução política para o conflito. Ao impulsionar um diálogo que propõe uma solução viável, longe dos rompantes demagógicos, isolacionistas e autoritários do ocupante da Casa Branca, o Brasil e a China não apenas promovem a paz, mas também reafirmam a importância de um multilateralismo verdadeiramente inclusivo.

O engajamento do governo Lula nesse projeto é uma demonstração de maturidade diplomática e visão estratégica. Como grande nação emergente, o Brasil pode usar o melhor da história de política externa pacifista, cooperativa, ativa e altiva, para liderar iniciativas que reforcem a busca por um novo equilíbrio do mundo. Esse compromisso, em parceria com a China, pode colocar os dois países na vanguarda das soluções políticas para crises internacionais. A condição sine qua non para obter bons resultados é ater-se aos princípios, não se desviar da linha justa, nem se deixar levar por pressões externas, como infelizmente ocorreu no âmbito da relação Lula-Biden.

Cooperação bilateral para o desenvolvimento

Ao alinhar suas estratégias de desenvolvimento – como a Iniciativa Cinturão e Rota e o Programa de Aceleração do Crescimento – Brasil e China criam um ambiente propício à inovação e ao crescimento econômico sustentável. A assinatura de 38 documentos durante a visita de Xi Jinping ao Brasil demonstra o potencial dessa sinergia. A cooperação em setores como energia limpa, inteligência artificial e infraestrutura pode elevar ambos os países a novos patamares de modernização e competitividade global.

Para o Brasil, a parceria com a China representa uma oportunidade única para potencializar o desenvolvimento. Para a China, a relação fortalece sua integração com os mercados latino-americanos e reforça seu papel como um parceiro confiável e solidário.

A política para aprofundar os laços com a China revela uma opção que alia o interesse nacional à construção do mundo multipolar. A elevação do relacionamento bilateral a uma “Comunidade de Futuro Compartilhado por um Mundo mais Justo e um Planeta mais Sustentável”, conforme decisão dos dois chefes de Estado, simboliza não apenas um marco diplomático, mas também um compromisso com a paz, a cooperação e o desenvolvimento.

A presidência brasileira do BRICS reforça a posição do país como um interlocutor global relevante e terá êxito se o país persistir no caminho da busca da paz mundial, do pertencimento ao Sul Global, da judiciosa escolha de parcerias estratégicas, da cooperação e do desenvolvimento compartilhado. Da postura assertiva de Lula dependerá o êxito do exercício pelo Brasil da liderança na condução de agendas globais de impacto, ao lado de parceiros estratégicos.

A cooperação sino-brasileira transcende interesses exclusivistas e está anos-luz distante de uma perspectiva de subordinação às potências imperialistas ocidentais. Uma ação correta do Brasil no âmbito externo pode acarretar impactos positivos na solução de conflitos, no desenvolvimento equitativo, na promoção de uma governança global inclusiva e justa e no soerguimento de uma nova institucionalidade consoante as exigências do mundo multipolar.

O mundo multipolar surge como uma alternativa necessária às ambições hegemônicas do imperialismo estadunidense e do imperialismo ocidental em geral. A cooperação entre os países do BRICS ampliado, ao lado de outros países emergentes, representa um avanço significativo na busca por um equilíbrio geopolítico.

A afirmação e consolidação do mundo multipolar é essencial para combater as desigualdades, as políticas de força, a militarização, as sanções, bloqueios e intervenções e garantir que países do Sul Global tenham voz ativa na tomada de decisões internacionais.

É um movimento que fortalece o multilateralismo, promovendo a paz e o desenvolvimento compartilhado. Com essa perspectiva, o Brasil precisa modificar a postura para com a Venezuela e a ampliação do BRICS. Ao renovar o compromisso com o fortalecimento da Celac e do Fórum China-Celac, o Brasil deve ser o principal fiador e promotor da unidade, o que é incompatível com o distanciamento com o país bolivariano. Quanto ao BRICS, o Brasil não tem o que temer do processo de ampliação. É um mito inventado por forças divisionistas e diplomatas com estreita visão burocrática que a ampliação do grupo redundaria em enfraquecimento relativo do “poder brasileiro”.

Com os BRICS à frente, os países do Sul Global terão mais possibilidades de desenvolvimento, paz e cooperação, em meio às contradições interimperialistas que tendem a se agravar na conjuntura em evolução. E isto é bom para o Brasil.

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