Solidariedade
Líder da greve de fome dos presos palestinos, Bargouthi afirma fortalecimento da luta nacional
Líder da greve de fome dos prisioneiros palestinos realizada entre 17 de abril e 28 de maio, o parlamentar Marwan Barghouthi, do Fatah, emitiu uma declaração nesta terça-feira (30) sobre o fortalecimento do movimento e da luta do povo palestino contra a ocupação israelense.
Barghouthi expõe ainda a resolução dos participantes no protesto em demanda pelo seu reconhecimento como prisioneiros de guerra, que têm estatuto e direitos definidos na Terceira e Quarta Convenções de Genebra, de 1949.
Uma das conquistas práticas da histórica greve de fome realizada por cerca de 1.500 palestinos encarcerados foi o retorno da segunda visita familiar a cada mês, suspensa há quase um ano, como informa o Comitê Internacional da Cruz Vermelha. A conquista reforça a denúncia de que, também contrariamente ao disposto nas Convenções de Genebra, muitos dos prisioneiros palestinos são transferidos para fora do território ocupado e estão encarcerados em território israelense, dificultando as visitas ainda mais.
Na declaração, Barghouthi enfatiza o fortalecimento do movimento dos prisioneiros e do povo palestino através da greve, que recobrou atenção e solidariedade internacional à luta pela libertação da Palestina. Desde o início da ocupação militar israelense, em 1967, organizações palestinas estimam que mais de 800 mil pessoas já foram encarceradas pelo regime ocupante. Hoje, 6.300 palestinos e palestinas estão nas prisões ou centros de detenção israelenses, inclusive 300 crianças.
Leia abaixo a declaração de Barghouthi, traduzida do árabe para o inglês pela Rede de Solidariedade aos Prisioneiros Palestinos Samidoun e do inglês para o português pelo Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz (Cebrapaz).
Primeira declaração do líder Marwan Barghouti após a vitória da greve pela liberdade e a dignidade
Em nome de Deus, o misericordioso,
Ao nosso grande povo, o povo da luta e do sacrifício,
Ao nosso povo da revolução e da intifada¹,
Às crianças das nações árabes e islâmicas,
Aos povos livres do mundo,
Amigos e amantes da paz e da justiça em todos os lugares… os prisioneiros palestinos nos cárceres e calabouços do inimigo sionista estiveram engajados em uma greve de fome por tempo indeterminado, que durou de 17 de abril até a noite de 28 de maio. Os prisioneiros nesta greve nacional cumpriram a mais extensa greve coletiva, um feito histórico nos registros de mais de 50 anos do movimento dos prisioneiros.
Apesar da repressão brutal e do terror indiscriminado usado pela administração israelense similar à Gestapo diante da greve, em que todos os grevistas foram transferidos de suas prisões em uma ação inédita, centenas deles foram postos em confinamento solitário e unidades repressivas especiais (Matsada, Dror e Yamaz) foram usadas em batidas e inspeções constantes ao longo dos 42 dias de greve.
O recurso à transferência dos prisioneiros em greve, feita em condições duras e brutais, tinha como objetivo tentar impactar ou enfraquecer a determinação, confiscando todos os pertences, inclusive roupas íntimas. Os prisioneiros foram impedidos do acesso a quaisquer materiais sanitários e de higiene, o que tornou suas vidas um inferno, e foram circulados rumores e mentiras vergonhosas. Ainda assim, o registro dos prisioneiros foi o de uma determinação inédita na história do movimento dos prisioneiros palestinos e a repressão israelense fracassou na tentativa de quebrar seu espírito.
Desta cena histórica e heroica, eu registro, com grande orgulho, a saudação à enorme determinação dos que participaram na greve de fome. E saúdo, com grande reverência, os mártires, suas famílias, e todos aqueles que se levantaram, que foram feridos e detidos nesta batalha da liberdade e dignidade pela Palestina.
Eu também gostaria de homenagear nosso grande povo, da nossa pura Palestina, do rio até o mar, e no exílio e diáspora. Agradeço seu grande apoio e esforços determinados pela causa dos prisioneiros e por sua greve, que devolveu a causa palestina à dianteira do cenário político internacional. Ao mesmo tempo, saúdo os povos árabes, islâmicos e amigos do mundo pelo nível de solidariedade e participação com que nos apoiaram.
Saudações a todos aqueles que participaram em campanhas midiáticas locais e internacionais, assim como à Associação BAR, ao Sindicato dos Médicos, ao Ministério da Educação, à Sociedade dos Prisioneiros Palestinos, à Comissão de Assuntos de Prisioneiros e Ex-Prisioneiros, enfatizando que a batalha pela liberdade e dignidade da Palestina é uma parte integral da luta por liberdade, independência, retorno, pela derrubada do sistema de apartheid na Palestina e pelo fim da ocupação.
Ao nosso grande povo, apesar de o governo do terror que lidera o regime de apartheid de Israel ter lançado um ataque contra a greve de fome, em uma tentativa fracassada e desesperada de esconder seus crimes, isso não intimidou os prisioneiros nem quebrou seu espírito de ferro. Não os dissuadiu de lutar nesta batalha com determinação e convicção, realizando uma saga heroica e épica. Eles têm sido capazes de alcançar várias conquistas justas e humanitárias, a primeira das quais é a retomada das segundas visitas mensais dos familiares dos prisioneiros, que foram suspensas há quase um ano, assim como a discussão dos problemas que se arrastam há anos, relativos às condições da vida diária, inclusive as condições das mulheres prisioneiras, das crianças, dos enfermos, do transporte² e processamento de transferências, o sistema de “cantina” (loja da prisão), a entrada de roupas, assim como a formação de um comitê de oficiais sêniores do Serviço Prisional para o diálogo continuado com os representantes dos prisioneiros nos próximos dias, para discutir todas as questões, sem exceções.
Por isso, e com a aproximação do mês sagrado do Ramadã, decidimos suspender a greve e dar a oportunidade de desenvolver essas discussões com o Serviço Prisional, enfatizando nossa firme disposição para retomar a greve se o Serviço Prisional não cumprir os compromissos que assumiu com os prisioneiros.
Nesta ocasião, estendo minhas calorosas congratulações aos heroicos prisioneiros por sua determinação e conquistas de humanidade e justiça, com uma homenagem especial aos prisioneiros na prisão de Nafha, que desempenharam um papel de liderança no sucesso dessa greve e na conquista dessa grande vitória. Também saúdo os prisioneiros que aderiram à greve nas prisões do Negev, Ofer, na clínica prisional de Ramle, Ashkelon, Gilboa, Megiddo, Ramon, as crianças e mulheres prisioneiras e, finalmente, na prisão de Hadarim, e a todos os que participaram, em todos os centros de detenção e prisões: tomo as suas mãos e beijo suas frontes.
Com a renovação do seu compromisso e participação nesta greve nacional, a mais longa e acirrada da história do movimento dos prisioneiros palestinos, há uma mudança na relação entre os prisioneiros e os mecanismos da administração prisional. A partir de hoje e de agora, não vamos permitir qualquer violação das conquistas e dos direitos dos prisioneiros. Além disso, esta batalha também é uma força para reconstruir e unificar o movimento dos prisioneiros em suas várias componentes, como um prelúdio da formação de uma liderança nacional unificada nos próximos meses. É a preparação para a batalha por alcançar o reconhecimento dos prisioneiros nos calabouços da ocupação como prisioneiros de guerra e prisioneiros [em luta por] libertação e pela aplicação completa da Terceira e Quarta Convenções de Genebra.
Ao nosso grande povo, enquanto reafirmo minha homenagem aos mártires da luta pela liberdade e a dignidade, insto o presidente palestino Abu Mazen [Mahmoud Abbas], a liderança da OLP [Organização para a Libertação da Palestina] e as correntes nacionais e islâmicas a cumprir seu dever nacional com os prisioneiros ao trabalhar por libertá-los e conquistar sua liberdade. Novamente, alerto contra qualquer retomada de negociações antes exigir uma libertação abrangente de todos os prisioneiros e detidos. Expresso minha gratidão especial a todas as instituições e órgãos dedicados aos prisioneiros, especialmente à Comissão de Assuntos dos Prisioneiros, liderada pelo combativo irmão Issa Qaraqe, a Sociedade dos Prisioneiros Palestinos e o combativo irmão Qaddoura Fares, o Alto Comissariado para os Assuntos dos Prisioneiros e a campanha popular e internacional pela libertação de todos os prisioneiros palestinos, liderada pela combativa advogada Sra. Fadwa Barghouthi.
Glória aos justos mártires!
Liberdade aos prisioneiros, pela sua libertação!
Viva a luta palestina pela liberdade e a dignidade!
Seu irmão,
Marwan Barghouthi (Abu al-Qassam)
Prisão Hadarim
Cela Nº 28
[1] Revolta, levante, em árabe
[2] Os prisioneiros palestinos denunciam o processo e o transporte usado para as transferências — vans em que seguem acorrentados frequentemente por longas horas, que são em geral minúsculas e têm as janelas tapadas com painéis pretos — como parte dos maus tratos a que são submetidos.
Moara Crivelente, do Cebrapaz