Está nas mãos da ‘comunidade internacional’ a opção entre a paz e a guerra no Saara
O secretário-geral da Frente Polisário, Mohamed Abdelaziz, foi reeleito pela maioria esmagadora dos participantes no 14º congresso do movimento de libertação, cujos trabalhos se desenvolveram em Dahla, um dos acampamentos de refugiados saarauís, reafirmando-se como o homem do consenso no seio da Frente Polisário.
A deliberação dos 2.472 congressistas de renovar a confiança em Abdelaziz se explica pela preocupação de “fortalecer a liderança da Frente Polisário”. Abdelaziz aceitou sua indicação de última hora, pois estava decidido a não mais reeleger-se para o posto máximo da direção da Frente Polisário, considerando que na organização não faltam quadros de valor à altura da tarefa.
Contudo, diferentemente dos congressos anteriores, o líder da frente Polisário não terá desta vez o direito de nomear os membros do seu secretariado nacional. A partir de agora, estes são eleitos pela maioria qualificada de 2/3 dos congressistas. Mohamed Abdelaziz deverá também habituar-se a que suas ações serão observadas com lupa, porque o 14º congresso fez da transparência um dos seus principais credos.
Além disso, decidiu-se reforçar a capacidade das instituições de controle da Frente Polisário. Assim, Abdelaziz dirigirá a partir de agora uma Frente Polisário renovada e reformada.
A base saarauí decidiu adotar um plano nacional de ação que será um mapa do caminho do movimento de libertação para os próximos quatro anos e que reflete a vontade de ver a Frente Polisário endurecer tanto o tom do discurso como a ação, a fim fazer as coisas andarem e realizar o sonho de conquistar a independência durante os próximos quatro anos.
Cansada de sua condição de refugiada e de sofrer, há quarenta longos anos, a repressão selvagem das forças colonialistas marroquinas nos territórios saarauís ocupados, a população saarauí exige que seu exército retome as armas se a comunidade internacional continuar recusando-se a assumir suas responsabilidades e, sobretudo, a fazer aplicar as resoluções da ONU sobre o conflito do Saara Ocidental, adotadas há cerca de 25 anos pelo Conselho de Segurança.
Nos campos de refugiados saarauís de Tindouf (área cedida pela Argélia), assim como nos territórios saarauís libertados, a base expressa o desejo de combater o Marrocos, que espolia suas riquezas, ataca suas crianças e viola suas mulheres há cerca de meio século. Em total impunidade.
“Os saarauís não podem deixar-se torturar e viver em condições insuportáveis. Preferimos retomar as armas e morrer dignamente. Em tal caso, morreremos por uma causa nobre. A espera durou muito, esperamos há muito tempo”, diz um jovem congressista, que nasceu num acampamento de refugiados e não pretende morrer ali.
As pressões nesse sentido foram confirmadas por Omar Mansour Mohamed Mebarek, porta-voz do congresso da Frente Polisário. Mansour, que é também o representante da Frente Polisário na França, indicou que a esmagadora maioria dos participantes no congresso, constituída por 52% de jovens de menos de 40 anos, defende a ideia de “mobilizar o máximo de meios para reforçar as capacidades operacionais do exército saarauí a fim de que esteja pronto a enfrentar qualquer eventualidade”.
A recente decisão da Corte de Justiça da União Europeia de anular o acordo agrícola e pesqueiro assinado em 2012 por Bruxelas e o Marrocos e o apoio do Parlamento Europeu ao projeto de ampliação das prerrogativas da Missão das Nações Unidas para a realização do Referendo no Saara Ocidental (MINURSO) à proteção dos direitos humanos nos territórios saarauís ocupados, certamente suscitaram um sopro de esperança e de otimismo no seio da população saarauí, que vê assim os esforços diplomáticos da Frente Polisário obterem resultados concretos. Isto não impede que muitas intervenções feitas no congresso, que se desenvolveu em clima de transparência, defendessem claramente a opção do retorno à guerra. Impaciente, a juventude saarauí afirmou notavelmente, por meio de seus numerosos representantes que ela “não quer mais permanecer de braços cruzados e esperar que a ONU e a comunidade internacional lhe deem o que não puderam dar durante 24 anos”.
Caracterizados por um funcionamento bastante democrático, os debates nas plenárias consagrados à apreciação do balanço da equipe dirigente da Frente Polisário revelam também um “profundo lamento” por parte de muitos congressistas. Um lamento ligado, pode-se dizer, ao fato de “ter-se aceitado, em 1991, depor as armas, ao passo que o Marrocos estava apontando suas armas”. Igualmente, os saarauís hoje se sentem “enganados pela comunidade internacional que não cumpriu suas promessas”.
Pode ser que a visita que o secretário-geral da ONU previu efetuar à região, com seu enviado especial para o Saara Ocidental, Christopher Ross, determine em larga medida a conduta que os saarauís adotarão em face do Marrocos. Na sala do congresso de Dahla, essa visita é percebida como decisiva. Para todos, a bola está no campo da comunidade internacional. E o tempo pressiona.
Zine Cherfaoui, enviado especial do jornal argelino El Watan ao congresso da Frente Polisário. Tradução de José Reinaldo Carvalho para o Blog da Resistência