A Turquia age como cabeça de ponte de potências imperialistas
Por José Reinaldo Carvalho*
A derrubada do avião bombardeiro russo SU-24 com dois pilotos a bordo por um míssil ar-ar a partir de um avião caça F-16 da Turquia, no espaço aéreo sírio, é fato de extrema gravidade que acrescenta fatores de tensão, instabilidade e ameaça de confrontação entre os dois países. A Turquia, cuja ação não encontra respaldo nas normas do Direito Internacional, manteve após o incidente uma atitude arrogante e inflexível.
A Rússia, por seu turno, advertiu que o ataque terá consequências graves nas relações bilaterais. “Foi um golpe pelas costas, assestado por cúmplices dos terroristas”, disse o presidente Vladimir Putin, ressaltando que o avião russo voava dentro do espaço aéreo sírio quando foi atacado pelo míssil turco.
O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, respaldou a posição turca: “A Turquia tem o direito de defender seu território e seu espaço aéreo”. Isto a despeito das provas apresentadas pela Rússia de que não violou o espaço aéreo turco. E criticou a ação militar da Rússia de combate aos grupos terroristas na Síria, a pedido do governo do país árabe.
Por sua vez, o secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, embora usando palavras conciliadoras e pedindo calma, instando Ancara e Moscou a manter contatos para prevenir tais situações no futuro, deu crédito à versão do seu aliado, a Turquia.
A derrubada do avião russo pela Turquia, durante uma operação de combate ao grupo terrorista autointitulado Estado Islâmico é reveladora da cumplicidade do governo turco com os bandos extremistas armados responsáveis pela guerra civil na Síria.
Foi uma ação agressiva que só encontra explicação no papel que a Turquia desempenha na guerra movida contra a Síria. É uma triste ironia que o país invoque a inviolabilidade das suas fronteiras quando as mantém abertas para os grupos terroristas, o tráfico de armas e de petróleo que os abastecem na guerra que fazem contra a Síria. Entre esses grupos, todos sabem, encontra-se o chamado Estado Islâmico. O regime de Erdogan cumpre o nefasto papel de cabeça de ponte da luta que as potências ocidentais, designadamente os Estados Unidos e seus aliados regionais – as monarquias reacionárias árabes e os sionistas israelenses – desempenham na escalada política e militar pela derrocada do governo do presidente da Síria, Bachar al-Assad. Reiteradas vezes esses atores do jogo geopolítico da região demonstraram que seu principal objetivo não é o combate ao terrorismo e sim o afastamento de Assad do poder. Esta estratégia é diametralmente oposta à da Rússia e do Irã, aliados do líder sírio.
O ataque ao avião russo pela Turquia põe este país e seus aliados da Otan em flagrante contradição com a Resolução 2249, aprovada por unanimidade pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, que conclama os Estados membros a tomarem todas as medidas necessárias, em conformidade com o Direito Internacional, para combater o autodenominado “Estado Islâmico”, que constitui ameaça sem precedentes à paz e à segurança internacional, conforme nota do Itamaraty.
Trata-se de uma posição política essencial na luta para eliminar o controle do grupo terrorista sobre territórios da Síria e do Iraque, e intensificar os esforços para prevenir e combater atos terroristas.
Merece destaque, na mesma Resolução, a conclamação que as Nações Unidas fazem aos Estados membros para deter o fluxo de combatentes à Síria e ao Iraque, bem como para eliminar suas fontes de financiamento.
A ação agressiva da Turquia, a ofensiva que o imperialismo estadunidense, contando com o apoio de Erdogan, move contra a Síria, assim como a oposição sistemática ao papel político e militar da Rússia, aumentam a instabilidade no Oriente Médio e o risco de generalização de um conflito militar de dolorosas consequências para todos os países da região.
É precipitado afirmar que já é a “terceira guerra mundial em curso”, como argumentaram alguns comentaristas de assuntos internacionais. Mas sem sombra de dúvida os acontecimentos tomam um rumo perigoso e ameaçador para a paz mundial, o que deve servir de alerta às forças políticas transformadoras, aos países democráticos, aos movimentos progressistas e a todos os amantes da paz para que desenvolvam ações em defesa da própria sobrevivência da humanidade.
Um amplo movimento pela paz e de oposição às políticas de guerra das potências imperialistas é cada vez mais necessário.
*Jornalista, editor do Blog da Resistência, especialista em Política e Relações Internacionais; é secretário de Política e Relações Internacionais do PCdoB