Angel Guerra Cabrera: O suposto “fim do ciclo progressista” (Primeira parte)

21/09/2015

Desde há algum tempo foi decretado pela direita, setores de esquerda desorientados da América Latina e do Caribe, e também da Europa, o fim do que chamam de ciclo progressista. Baseiam sua afirmação em especulações muito afastadas de um autêntico trabalho de campo e do conhecimento ou correta interpretação, da história de lutas de nossos povos latino-americanos e caribenhos. Ou, simplesmente, a sustentam em seus desejos.

Por Angel Guerra Cabrera*

Existem, sem dúvida, elementos de caráter objetivo e subjetivo que têm levado a uma diminuição no ímpeto ofensivo dos chamados governos progressistas. Além disso, sabe-se que os processos populares e revolucionários não são linearmente ascendentes todo o tempo mas sofrem marchas e contramarchas, fluxos e refluxos, por mais que estejam sendo bem dirigidos e por maior que seja o consenso popular que tenham conquistado.

Mas antes de entrar nesse assunto, creio importante dizer que prefiro outra denominação para esses governos à denominação de progressistas, mais adequada em minha humilde opinião à realidade da América Latina e Caribe desde o ascenso à presidência da Venezuela por Hugo Chávez (1999). Por isso os qualifico como governos que em distintos graus são independentes dos Estados Unidos, se distanciam dos ditames do Consenso de Washington, defendem ativamente a unidade e a integração latino-caribenha e um mundo multipolar. Se considerarmos essas características, dizer que em alguma medida estão presentes em Antigua y Barbuda, Argentina, Bolívia, Brasil, Cuba, Dominica, Equador, El Salvador, Granada, Nicarágua, San Cristóbal y Nieves, Santa Lucía, San Vicente y Granadinas, Suriname, Uruguai e Venezuela.

Retomando o fio, é evidente que o desaparecimento em 2013 de um líder com as qualidades de Hugo Chávez, desacelerou, não obstante os valiosos esforços do digno Nicolás Maduro, o ritmo de avanço com que marchavam a unidade e a integração de nossa região. A isso se uniram a abrupta queda do preço das matérias primas, entre elas o petróleo; o fato de alguns países terem entrado em recessão, como a Venezuela e o Brasil, ou de ter diminuído o seu crescimento, com a consequente diminuição de fundos para os programas de redistribuição da riqueza e quedas no poder aquisitivo da população; ademais, a necessidade de recorrer ao crédito internacional, fundamentalmente da China, para compensar a queda de suas receitas em divisas. Devemos acrescentar erros e insuficiências na gestão dos governos e nos seus partidos.

Mas antes de 2013 já havia começado outra variável fundamental: a contraofensiva dos Estados Unidos e das  oligarquias contra os governos independentes e contra a unidade e a integração da América Latina e Caribe, desde o ataque ianque-uribista ao território equatoriano e o restabelecimento da Quarta Frota por Washington (2008), até os golpes de Estado exitosos contra os presidentes Zelaya e Lugo em Honduras (2009) e Paraguai (2012) e os derrotados na Bolívia (2008) e no Equador (2010) contra Evo e Correa.

Tudo isso antecedido pelo golpe e o boicote petroleiro na Venezuela (2002-2003) e continuado na última década com um permanente assédio desestabilizador contra esses governos. Nesse empenho as chamadas indústrias culturais estadunidenses – incluídos os conglomerados corporativos de comunicação da América Latina e Caribe -, substituem literalmente como armas de guerra os exércitos mediante o envenenamento, embrutecimento e engano de milhões de pessoas. Isto está muito claro nestes dias no Brasil, no Equador e na Argentina. Somemos os programas estadunidenses que formam ativistas nas técnicas das revoluções coloridas, que incluem o uso das redes sociais digitais.

Hoje vemos que além do embate prioritário contra Maduro, atacam profundamente Correa, Dilma e Lula, e fustigam  Sánchez Serén (El Salvador) . Mas não  existe o fim de tal ciclo. O que há é o golpismo de direita devido à sua impossibilidade de derrotar esses governos nas eleições.

A razão é simples. Apesar da crise econômica internacional que golpeia também e duramente os países desenvolvidos como Estados Unidos, Alemanha, França e Japão, os governos independentes de Washington têm conquistas sociais incomparáveis na América Latina e Caribe que chegam àqueles que nunca tiveram nada.

Entre estas conquistas estão: tirar da pobreza milhões de pessoas, ter levado às salas de aula milhões de estudantes, estendido apreciavelmente a assistência médica e elevado a qualidade de vida de suas populações.

Voltarei ao tema.

*Angel Guerra Cabrera é jornalista cubano residente no México e colunista do “La Jornada”; tradução do Blog da Resistência.

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