Opinião

Enver Hoxha, líder comunista albanês, nasceu há 115 anos 

16/10/2023

Por José Reinaldo Carvalho, membro do Comitê Central e da Comissão Política Nacional do Partido Comunista do Brasil (PCdoB)

Transcorre neste 16 de outubro o 115º aniversário natalício de Enver Hoxha, fundador do Partido Comunista da Albânia (depois Partido do Trabalho da Albânia), comandante da Luta de Antifascista de Libertação Nacional (1939-1944), dirigente do Estado e do Governo da República Popular da Albânia (depois República Popular Socialista da Albânia). 

Ao longo de mais de 50 anos de militância comunista, assumindo tarefas gigantescas e complexas, enfrentando as mais diversas dificuldades e aceitando os grandes desafios do seu tempo, traduzidos em inumeráveis batalhas, Enver Hoxha fundiu seu nome ao do seu povo. Temperado ideologicamente no fogo da revolução, no estudo sistemático e profundo da ciência social mais avançada, o marxismo-leninismo, no exercício da vida orgânica e da direção partidária, ele converteu-se num líder comunista da estatura dos grandes dirigentes históricos do século 20.  

O estudo da experiência da revolução popular e da construção do socialismo na Albânia mostra a formação e a evolução de um pensador marxista-leninista que soube iluminar a prática com a teoria e, inversamente, fazer generalizações a partir da prática. Não é pequena a bibliografia de Enver Hoxha. Os 60 volumosos tomos que escreveu contêm profundos estudos, análises multilaterais e acertadas conclusões sobre candentes problemas em todos os domínios do conhecimento e da ação social. Particularmente no terreno da tática e estratégia da revolução, da construção do socialismo, dos princípios de organização do Partido e do Estado, da política internacional e da luta contra o revisionismo, Enver Hoxha deu contribuições enriquecedoras do acervo teórico do movimento comunista. 

A atividade de Enver Hoxha para fundar o Partido, organizar e dirigir a luta de libertação nacional desenvolveu-se em condições muito peculiares. Nos anos 1930 reinava nas fileiras revolucionárias e no movimento comunista da Albânia a confusão ideológica e a dispersão orgânica. Não eram poucas as ideias falsas e as posições políticas pseudomarxistas no interior dos grupos que deram origem ao Partido. Desde então a lucidez de Enver Hoxha se fez sentir. Ele viu com perspicácia que o Partido só desempenharia seu papel e cumpriria a missão de vanguarda da classe operária e do povo oprimido se sua criação fosse o resultado de um amadurecimento político e ideológico, jamais da conciliação oportunista de concepções antagônicas — a proletária e a pequeno-burguesa. A garantia para que o Partido não surgisse com esse “pecado original” foi a elaboração de uma linha geral única, sobre bases científicas marxista-leninistas e a adoção dos princípios leninistas de organização. Isto cimentou a unidade política, ideológica e orgânica das fileiras comunistas e deu solidez à nascente organização. 

A revolução na Albânia não triunfaria se a direção adotasse uma orientação dogmática, copiasse modelos externos e não levasse em conta as condições do país e do momento histórico. Ali a luta emancipadora realizava-se com dois condicionantes: de um lado, o subdesenvolvimento estrutural do país, à época o mais atrasado da Europa. A economia era fundamentalmente agrária. A classe operária pouco numerosa e dispersa em pequenos estabelecimentos fabris. Por outro lado, o país estava ocupado militarmente pelas potências fascistas (Alemanha e Itália). Nessas condições, a revolução na Albânia assumiu o caráter de luta de libertação nacional. Com Enver Hoxha à frente, o Partido elaborou sua linha política, a estratégia e a tática da revolução, tendo em conta que o inimigo principal eram os fascistas italianos e alemães e os setores internos a eles aliados. O centro da orientação tática era unir o povo em torno de uma organização de massas ampla — a Frente de Libertação Nacional. O objetivo imediato da luta era a expulsão dos ocupantes fascistas e a conquista de uma Albânia livre e democrática. 

Qual deveria ser o caminho da revolução, quais as formas e os métodos de luta? Na resposta a essa questão e na experiência vivida na Albânia despontou a argúcia e a ousadia do pensamento de Enver Hoxha. Nas condições históricas concretas em que ocorreu a luta revolucionária na Albânia, a tomada do poder não ocorreria através de um levantamento armado rápido e único. A revolução foi uma multiplicidade de ações, um processo complexo que amadureceu a partir das manifestações de massas antifascistas, das ações ousadas nas cidades, das escaramuças dos grupos guerrilheiros, até se transformar, após a organização e o crescimento do Exército de Libertação Nacional, em insurreição geral popular. 

De grande significado na obra de Enver Hoxha são as suas generalizações acerca da construção do socialismo num país agrário e atrasado. Pode-se dizer, sem exagero, que ele resgata, com posições leninistas, uma das mais importantes polêmicas do movimento comunista. Pode ou não uma revolução popular vitoriosa conduzir um país atrasado ao socialismo? 

Se tomarmos como referencial experiências como as da China, da Iugoslávia e das mais recentes lutas de libertação nacional e revoluções populares, como os processos de descolonização da África, a guerra do Vietnã, a revolução sandinista da Nicarágua, a Revolução cubana e a bolivariana da Venezuela, chegaremos à conclusão de que não se trata de uma questão menor. 

Segundo Enver Hoxha, “na época do imperialismo, quando se criou o sistema mundial da economia capitalista, quando amadureceram em seu conjunto as condições para a revolução socialista, o atraso econômico de um determinado país não constitui um obstáculo insuperável para o triunfo da revolução democrática e sua rápida transformação em revolução socialista”. Enver acreditou na “possibilidade prática e real da transição direta dos países atrasados do velho regime feudal-burguês (caso da Albânia) ao socialismo, superando a etapa do capitalismo desenvolvido”. 

Tomado o poder político, ato contínuo destruiu-se a base econômica dos latifundiários e da burguesia, a partir da ofensiva sobretudo contra as classes dominantes colaboracionistas. O Partido elaborou um plano para socializar os meios de produção, primeiro nas cidades, depois no campo, através de um complexo e arrojado processo de coletivização. Foi o estabelecimento das relações de produção socialistas que impulsionou o desenvolvimento das forças produtivas, tirou o país do atraso e viabilizou a construção do socialismo. Nada disso foi feito espontaneamente, mas a partir de um programa baseado no marxismo-leninismo, para o qual a contribuição de Enver Hoxha foi decisiva.

Outra importante questão da revolução albanesa que exigiu sistematização dos princípios marxistas-leninistas por Enver Hoxha e pelo PCA foi a do poder político. Em muitos dos seus escritos do período da luta de libertação nacional, Enver Hoxha explicitou que a conquista do poder político pelo proletariado, dirigido por seu partido de vanguarda, era o problema-chave da revolução. Este é, aliás, um ensinamento que vem da época de Marx, da Comuna de Paris e posteriormente, da revolução russa. Nisso também apareceram particularidades. Durante a luta de libertação nacional o poder popular surgiu embrionariamente sob a forma de conselhos de libertação nacional nas regiões libertadas. Enver Hoxha definia esses conselhos como “órgãos da luta e da revolução, bases do regime democrático”. A vitória da revolução popular, a implantação do novo poder em nível nacional, assinalou o cumprimento da primeira etapa da revolução — antifeudal, antiimperialista e democrática e iniciou a transição rumo ao socialismo. Enver dirigiu pessoalmente a criação do poder popular. Esteve à frente da organização do Congresso antifascista de libertação nacional que em 24 de maio de 1944 proclamou a fundação do Estado de democracia popular. Ele compreendeu que, vitoriosa a revolução, o povo só se manteria no poder se este novo Estado evoluísse para uma democracia de tipo superior, com a hegemonia da classe operária — a ditadura do proletariado. 

Vemos, assim, que a passagem de uma etapa a outra da revolução, traduzida nas primeiras medidas estruturais nos campos econômico e político, constituem uma aplicação criadora da teoria leninista da revolução. É uma experiência que se mostrou valiosa pelos resultados que deu e pedagógica pelos ensinamentos que encerra.

Enver Hoxha marcou a sua passagem na História também como resoluto defensor da soberania nacional e da integridade territorial do seu país. Já nos referimos ao caráter democrático e popular da revolução albanesa. É necessário dizer também do caráter nacional desta revolução, durante a guerra e depois dela. O povo albanês tem antiga tradição de pugna pela independência nacional, uma experiência multissecular de refregas com ocupantes de várias origens. Essa experiência acumulada se fez sentir com toda a sua força quando os exércitos de Mussolini e Hitler invadiram o território albanês. O povo se uniu como um punho e atendeu ao chamado do Partido para derrotar o inimigo externo. Mas a luta contra as ameaças do imperialismo à soberania nacional não terminaram com o triunfo da revolução. Em certo sentido ela até se exacerbou. Mudou apenas na forma e na correlação de forças. Agora tratava-se do combate de um povo no poder em defesa do seu país, da liberdade e da independência conquistadas com sangue. 

Uma grande batalha nesse sentido foi o esforço contra as pressões, intervenções e chantagens do imperialismo anglo-americano. O Movimento de Libertação Nacional na Albânia foi parte da grande coalizão de forças formada mundialmente para derrotar as potências do eixo nazi-fascista representado pela Alemanha, a Itália e o Japão. Objetivamente, durante a guerra, Estados Unidos e Inglaterra foram aliados do movimento de libertação nacional. Mas Enver Hoxha tinha clareza de que esta aliança era limitada e que, vencida a guerra, inevitavelmente se romperia. “Sabemos quem são os anglo-americanos — dizia Enver Hoxha — e não esquecemos em nenhum momento que são capitalistas, que estão contra o comunismo, contra o socialismo; nem eles esquecem quem somos nós, nem nós esquecemos quem são eles. Agora estamos aliados a eles contra o fascismo italiano e o nazismo alemão e permaneceremos fiéis a esta aliança.” 

As missões anglo-americanas, logo após a guerra, de tudo fizeram para impedir a implantação do socialismo na Albânia. Queriam uma monarquia constitucional encabeçada pelo rei Zogu, que estava exilado na Inglaterra. Esta posição independente, aliada a uma correta linha internacionalista constituíram os fundamentos para a elaboração da política externa do novo Estado albanês, baseada no princípio da autodeterminação e da soberania, na luta contra o intervencionismo das grandes potências e na solidariedade com os povos. 

Enver Hoxha forjou-se como dirigente destacado no movimento comunista internacional com a luta desencadeada contra o revisionismo contemporâneo e em defesa dos princípios do marxismo-leninismo. Não foi um debate acadêmico, apenas no campo teórico, ou um combate a partir de posições nacionalistas. Foi um embate histórico da dimensão do que Lênin moveu contra os oportunistas de direita da segunda Internacional. Foi a expressão do agravamento da luta de classes no plano internacional, a reação dos comunistas à tentativa de destruição do socialismo. 

Nos dias atuais, ainda vivemos os efeitos da contrarrevolução ocorrida no mundo no início da década de 1990, incluindo a derrocada do socialismo na Albânia. Malgrado o contexto histórico diferente e a necessidade de atualização política e ideológica do movimento comunista, a obra de Enver Hoxha reveste-se de valor e significado. Nela, os combatentes de vanguarda têm à sua disposição importantes ensinamentos.  

Os comunistas brasileiros se orgulham da sólida amizade forjada entre o Partido do Trabalho da Albânia e o Partido Comunista do Brasil, presente em batalhas comuns, sob a liderança dos seus inesquecíveis líderes – Enver Hoxha e João Amazonas – que desenvolveram fraternos laços de camaradagem. 

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