Angel Cabrera: Putin volta a irromper no cenário

03/10/2015

O início de intensos ataques aéreos pela Rússia a posições estratégicas do autodenominado Estado Islâmico (EI) na Síria é uma clara expressão do mundo multipolar em que os Estados Unidos e seus aliados já não podem atuar a seu talante.

Por Angel Guerra Cabrera*

Há 20 dias, o chanceler Serguei Lavrov disse que a Rússia mantém sua cooperação militar com a Síria e que podia incrementá-la se Damasco o solicitasse. “Temos ajudado, seguimos ajudando e ajudaremos o governo sírio quando se trate de fornecer tudo de que o exército sírio necessite”, acrescentou. Disse que a Rússia queria evitar que a Síria se convertesse em outra Líbia, em alusão ao imenso caos reinante neste país desde que foi bombardeado e despedaçado pela Otan.

Nesta semana, ao dirigir-se à Assembleia Geral da ONU, o presidente Vladimir Putin foi muito crítico aos países que se sentem com o direito de atuar à margem da organização internacional e de sua Carta, que intervieram militarmente e dilaceraram vários países do Oriente Médio. Ao referir-se à responsabilidade da Otan no surgimento do EI e à hipocrisia de alguns que dizem lutar contra o terrorismo, repreendeu: “Quero dirigir-me a todos aqueles que ajudaram de fora a avivar os conflitos no Oriente Médio e na África: Dão-se conta do que fizeram?” “Todos os intentos de jogar com os terroristas, de financiá-los, são fatais e podem ter consequências catastróficas. Senhores, estão se metendo com pessoas muito cruéis, mas que não são tontas nem primitivas. Não são mais tontas que vocês e não se sabe quem utiliza quem para seus próprios fins”.

O EI é outro Frankstein criado pelo afã de despojo imperialista. Estados Unidos, Reino Unido, França, Arábia Saudita, Turquia e Catar financiaram rebeldes sírios supostamente moderados que terminaram ocupando extensas zonas do país árabe às ordens da Al Qaeda e algumas de suas filiais. Logo, ao que parece, com uma boa mão dos serviços secretos de Israel derivaram nesse ente bárbaro e sanguinário que saiu do seu controle –como lhes ocorreu em dado momento com os talibãs no Afeganistão – e já se estende por vastas regiões da Síria, do Iraque e tenta desestabilizar o Líbano. Seu propósito declarado é constituir um califado “islâmico” em todo o mundo muçulmano. Contudo, despertou a condenação das mais prestigiosas autoridades teológicas do islã.

Até agora a coalizão criada pelos Estados Unidos há um ano para combater o EI, supostamente constituída por 60 países, não conseguiu provocar nem cócegas com seus bombardeios aéreos. Enquanto isso, o Pentágono confessou o fracasso de seus multimilionários planos para treinar rebeldes sírios “moderados” que façam frente à organização extremista. Muitos deles foram mortos assim que entraram no território sírio ou se passaram com armas e bagagens às fileiras do inimigo que se supunha deviam combater.

Uma diferença crucial entre a coalizão criada pelos Estados Unidos e o esforço que a Rússia inicia é que a primeira surgiu sem contar com o governo legítimo sírio do presidente Bashar al-Assad nem com o Conselho de Segurança da ONU. Suas ações, portanto, são ilegais e ilegítimas.

Diferentemente, a força aérea russa está na Síria por solicitação de Damasco e em acordo com os governos do Irã e do Iraque. Na capital deste último estabeleceram um Centro de Informação que coadjuva o intercâmbio de inteligência e ajuda a coordenar as ações contra o EI. Em linha com isso, Putin fez um chamamento aos Estados Unidos e seus aliados a somar-se a um esforço conjunto para liquidar o EI e inclusive dissuadir os jovens que se sentem atraídos por este e dar a oportunidade de que aqueles que entraram na aventura possam sair.

Mas fazê-lo mediante uma resolução do Conselho de Segurança da ONU. Sublinhou, ademais, que era “chave” a participação dos países árabes e islâmicos e mencionou em particular o Irã, a Arábia Saudita e o Egito. É impossível seguir aguentando a ordem mundial existente, resumiu Putin.

Ao completar-se os 70 anos da fundação da ONU pudemos apreciar uma argumentação semelhante nas brilhantes e muito aplaudidas palavras do presidente Raúl Castro, o que é muito importante, pois Cuba é referência mundial dos povos que lutam pela justiça social, a paz e a cooperação internacional.

*Jornalista cubano residente no México

Fonte: Cubadebate [www.cubadebate.cu]

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