Opinião
Iniciativa “Cinturão e Rota” e laços fortes com a China são vias para o desenvolvimento nacional e a multipolaridade
Objetivo da iniciativa “Cinturão e Rota”, ao qual o Brasil deveria se associar, é criar uma comunidade de desenvolvimento compartilhado, escreve o dirigente comunista José Reinaldo Carvalho
José Reinaldo Carvalho (*) – A visita de Estado do presidente Xi Jinping ao Brasil no dia 19 de novembro, não será um encontro diplomático de rotina. Trata-se de um momento especial para o Brasil aproveitar a oportunidade de alavancar sua economia, seu papel na globalização e sua inserção mais protagonista no mundo multipolar, sem apego a fórmulas ultrapassadas de pertencimento ao “mundo ocidental”. Com a Iniciativa “Um Cinturão, Uma Rota” (BRI, na sigla em inglês), proposta pela China, o Brasil tem uma oportunidade de ouro para consolidar um projeto de integração econômica com impacto direto no desenvolvimento de sua infraestrutura e indústria. A adesão integral do Brasil à BRI representaria não apenas o fortalecimento de laços com a China, mas também um passo importante para a consolidação da multipolaridade, uma meta que favorece a autonomia dos países do Sul Global e se opõe às pretensões hegemônicas do imperialismo estadunidense.
A Iniciativa “Um Cinturão, Uma Rota” foi lançada em 2013 e busca promover a conectividade global por meio de investimentos em infraestrutura de transportes, energia, telecomunicações, entre outros setores. Até o momento, mais de 140 países já se somaram a esse esforço, que movimenta trilhões de dólares e vem transformando regiões em desenvolvimento.
De acordo com a formulação da própria China, exposta em vários documentos oficiais e em pronunciamentos de seus líderes, o objetivo da BRI é ajudar a construir uma comunidade global com futuro compartilhado. A BRI envolve países em diversas regiões do mundo, em diferentes estágios de desenvolvimento e com distintas culturas, transcendendo diferenças em ideologias e sistemas sociais, sem pretensões hegemônicas nem propósitos geopolíticos exclusivistas.
A BRI possibilita que diferentes países compartilhem oportunidades, alcancem desenvolvimento e prosperidade comuns e construam uma comunidade de interesses, em confiança política mútua, integração econômica e inclusão cultural.
A BRI defende a cooperação ganha-ganha e enfatiza que todos os países são participantes, contribuintes e beneficiários iguais. É um motor propulsor do desenvolvimento econômico integrado e da obtenção de ganhos recíprocos.
Colateralmente, em linha com as tendências contemporâneas, a BRI impulsiona o desenvolvimento verde, inclusivo e sustentável.
É uma iniciativa inserida nos princípios de cooperação internacional da China, compreendida no âmbito de três outras iniciativas lançadas desde que em 2012 Xi Jinping assumiu a liderança máxima do país, proclamou a construção do socialismo com peculiaridades chinesas na nova era e formulou uma teoria correspondente. Refiro-me às três iniciativas globais para a política externa apresentadas pelo presidente chinês e secretário-geral do Partido Comunista da China, força dirigente da sociedade: a Iniciativa de Desenvolvimento Global, a Iniciativa de Segurança Global e a Iniciativa de Civilização Global.
Para o Brasil, integrar-se plenamente à BRI significa acesso a um fundo de investimentos de escala mundial, essencial para o crescimento da infraestrutura, que é um dos entraves ao desenvolvimento do país e cuja superação é tão necessária à competitividade de produtos brasileiros no mercado global. Obras de infraestrutura poderiam ser financiadas pela BRI, facilitando a saída de produtos para mercados internacionais, inclusive o próprio mercado chinês, que é o maior parceiro comercial do Brasil. A BRI pode também contribuir para a modernização tecnológica do Brasil. A China é hoje uma referência em áreas como tecnologia 5G, inteligência artificial e energias renováveis.
O fortalecimento das relações do Brasil com a China, para além da importância da cooperação bilateral, deve ser compreendido também como um poderoso vetor para fortalecer a multipolaridade no sistema internacional. A China é uma potência emergente e tem se mostrado um aliado consequente dos países em desenvolvimento, um país amigo dos países do Sul Global. Corresponde aos interesses nacionais o fortalecimento da multipolaridade, que é o cenário mais favorável para a nossa inserção soberana no mundo considerando o quadro de turbulências e pretensões hegemônicas da potência que ainda lidera o imperialismo coletivo ocidental, os Estados Unidos.
Diferentemente dos Estados Unidos, a China tem uma política externa que respeita a soberania dos países com os quais se relaciona, oferecendo oportunidades de cooperação sem exigir alinhamento ideológico. Para o Brasil, que historicamente busca autonomia em suas relações internacionais, isto é fundamental. O Brasil já deu importantes passos no rumo da autonomia em face do imperialismo estadunidense. Não é agora, no momento de colher os frutos e amadurecer como nação cônscia de seus interesses e missão, que vai cair na trampa de seduções e ameaças dos EUA, que pretendem transformá-lo em peão da luta para impedir a multipolaridade e a ascensão de outras potências.
Os Estados Unidos têm uma estratégia para frear a expansão da BRI e reduzir as relações entre o Brasil e a China. Dessa estratégia faz parte dificultar a aproximação entre países da América Latina e a China, argumentando que essa relação pode comprometer a soberania e a segurança da região. Tudo isso para manter a América Latina como sua área de influência.
Além disso, a relutância dos Estados Unidos em aceitar a ascensão de novas potências e o fortalecimento da multipolaridade é evidente. Caso se afaste da BRI e não intensifique sua parceria com a China, o Brasil arrisca-se a cair na armadilha da dependência dos interesses econômicos e geopolíticos norte-americanos, enfraquecendo sua posição no cenário global.
Reforçar as relações bilaterais com a China e aderir à Iniciativa “Um Cinturão, Uma Rota” representam dar passos rumo ao desenvolvimento nacional e à multipolaridade. Esta é uma opção estratégica de longo prazo. O importante é persistir na marcha que já está em curso.
É o que demonstra a experiência contemporânea, como assinala editorial publicado em 14 de novembro pelo jornal chinês Global Times: “Nos últimos 10 anos, a China e a América Latina e Caribe (ALC) usaram a cooperação de alta qualidade do Cinturão e Rota como uma plataforma prática, aderindo aos princípios de ampla consulta, contribuição conjunta e benefícios compartilhados, e trabalhando juntos para o desenvolvimento comum. Da conectividade comercial ao aprendizado cultural mútuo, de interesses compartilhados a valores ressonantes, a construção da comunidade China-ALC com um futuro compartilhado continua a atingir novos marcos, fornecendo insights profundos para as relações internacionais no mundo de hoje.”
(*) Jornalista, escritor, editor do Resistência, membro do Comitê Central e da Comissão Política Nacional do Partido Comunista do Brasil, onde coordena o setor de Solidariedade e Paz