Opinião
Correlação de forças na geopolítica mundial na atualidade
Por Lejeune Mirhan (*)
Quando usamos o termo correlação de forças no mundo estamos querendo analisar quais são as forças políticas em cada um dos campos existentes na sociedade. Para efeitos de análise neste livro adotamos basicamente a existência de dois campos fundamentais: O campo do imperialismo liderado pelos Estados Unidos e o da Resistência cujas forças ainda não estão sob um comando unificado.
O mundo que vivemos hoje é ainda um mundo unipolar. Ou seja, existe apenas um grande líder e um grande polo que são os Estados Unidos e seus países satélites. Esse mundo é decorrente ainda do longínquo ano de 1991 quando em dezembro desse ano a União Soviética deixou de existir. Os Estados Unidos haviam vencido a guerra contra o Iraque, na verdade uma agressão e não uma guerra. Nestes quase trinta anos que se passaram podemos dizer que o mundo vive um processo lento de transição para a multipolaridade.
O domínio dos Estados Unidos sobre a totalidade do mundo é imenso. Esse domínio ocorre de forma muito clara nos campos econômico e cultural mas sobretudo no campo militar. Estima-se que esse país possui em torno de 1.1 milhão de militares espalhadas por todos os continentes da Terra. Suas sete frotas navais, sempre lideradas por um porta-aviões nuclear e composto por mais de 10 navios auxiliares, estão espalhadas pelo mundo de tal forma que qualquer possa ser acessível para um ataque aéreo sem que seus jatos precisem de uma pista em terra para decolar.
No entanto, é certo que existem novos polos em construção. Os mais importantes deles se aglutinam em torno da sigla Brics, que são os países Brasil, China, Índia, Rússia e África do Sul. O golpe desfechado no Brasil contra a presidente Dilma Rousseff em 2016, visava entre outras coisas, se não retirar o “B” da sigla Brics, pelo menos enfraquecê-lo. Pessoalmente não creio que o Brasil sairá dos Brics. Em 2019 inclusive deveremos de ficar com a presidência rotativa do bloco. Mas, seremos quase que um espião no bloco pois o novo governo que toma posse em janeiro deste ano estará subordinado aos Estados Unidos.
3.1. As instituições do campo imperialista: Vamos listar a partir de agora todas as instituições que compõem esse campo do imperialismo. Começaremos pelas instituições econômicas e depois listaremos as instituições de formação de pensamento. Ao final agregaremos mais algumas forças que integram esse campo. Vamos a elas:
3.1.1. FMI – As instituições econômicas basicamente são as que foram criadas no famoso encontro de Breton Woods realizado nos Estados Unidos em 1944 no estado de New Hampshire. É sempre bom registrar que o Brasil esteve presente com uma grande delegação de 9 pessoas que era liderada pelos já falecidos economistas liberais Octávio Gouveia Bulhões e Roberto Campos. Este último, ministro da Fazenda do primeiro governo militar da ditadura de 1964 era conhecido nos meios políticos em especial da oposição como “Bob fields”.
A data formal da constituição do Fundo Monetário Internacional deu-se em 27 de dezembro de 1945. Ao todo 29 membros da ONU eram seus membros, mas somente em abril de 1964 as Nações Unidas reconheceram formalmente o FMI. Nunca é demais lembrarmos que nesse período a Inglaterra já não era mais a potência hegemônica no mundo. Da mesma forma como sua moeda, a libra esterlina, não era mais a principal moeda de troca no comércio internacional.
Um dos debates que polarizou a conferência de Breton Woods foi exatamente a adoção de uma nova moeda internacional que seria usada no comércio entre países. É claro que estamos falando do dólar estadunidense. O chefe da delegação inglesa, Lord John Maynard Keynes, lutou bravamente para defender os interesses do seu país. Acabou aceitando a imposição da nova moeda mas em troca exigiu que o dólar americano tivesse seu lado equivalente em ouro. Foi fixado que uma onça Troy equivalesse a 31,1 gramas de ouro. Isso foi aprovado na conferência. Ou seja, qualquer cidadão do mundo poderia ter seus dólares e resgatar o equivalente em ouro junto à casa da moeda dos Estados Unidos. Isso foi feito: o ouro era depositado no local chamado forte Knox, que é o nome de uma pequena cidade no interior do Kentucky.
É importante registrar que essa paridade perdurou por pouco tempo. Ela durou até 15 de agosto de 1971, portanto apenas 27 anos. O então presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon, anunciou nessa data que estava rompendo a paridade a partir daquele momento. Dessa forma o dólar passou a ser apenas um papel impresso na cor verde sem nenhum lastro equivalente em ouro. Mas nós nos perguntamos por que o mundo inteiro então continuou aceitando o dólar como moeda de troca? A resposta é simples. Ela vale para todas as moedas que vigeram durante os impérios que antecederam o dos Estados Unidos. A moeda forte de uma época bem como a língua franca utilizada em parte do mundo é sempre a moeda e a língua da potência imperialista daquele momento histórico.
Os objetivos formais do Fundo Monetário Internacional relacionam-se à ajuda para a reconstrução do sistema monetário em todo o mundo. Pode prestar também auxílio aos países-membros. Quando isso acontece, ou seja um país recorre ao FMI para um empréstimo, ele é obrigado a seguir as regras do modelo econômico neoliberal que a organização impõe.
3.2.2.Banco Mundial – Instituição econômica e financeira também decorrente da nova arquitetura monetária internacional estabelecida no final de 1944. Formalmente a missão do Banco Mundial é erradicar a extrema pobreza na humanidade diminuindo a desigualdade. Ele seria uma espécie de banco de desenvolvimento undial, nos moldes do que temos no Brasil com o BNDES.
3.2.3. OMC – Essa organização foi fundada em primeiro de janeiro de 1995, em substituição ao antigo GATT, que na sigla inglesa quer dizer General Agreement on Tariffs and Trades, ou seja, Acordo Geral de Tarifas e Comércio que existia desde 1947. O antigo GATT não era propriamente uma entidade ou instituição, mas como o próprio nome diz era um acordo que a maioria das nações que eram membros da ONU respeitavam. A OMC é um órgão do sistema das Nações Unidas presidida atualmente inclusive por um brasileiro chamado Roberto Azevêdo. Seu objetivo é regular o comércio entre os seus 159 membros.
3.2.4. BIS – Esta instituição chama-se Banco Internacional de Compensações ou Banco de Pagamentos Internacionais que na sigla em inglês é Bank for International Settlements. Sua sede fica na cidade de Basileia, na Suíça, e reúne cinco bancos centrais de todo o mundo. Ele é parte da arquitetura financeira e monetária internacional, não há uma data formal de sua fundação que ocorre por volta de 1962 a partir do chamado G10, o grupo dos dez principais países da época. Esse banco tem sede na cidade de Hong Kong e Cidade do México. Existem apenas 140 clientes. Seu objetivo é promover a cooperação monetária e financeira internacional.
2.2.5. Clubes – Vamos falar agora de alguns clubes que não são clubes recreativos ou associativos como nós conhecemos. São clubes que reúnem membros e associados bastante seletivos como veremos. São três os clubes mais famosos deste campo que descrevemos como campo do imperialismo e dos interesses da burguesia capitalista financeira. São eles:
3.2.5.1. Clube de Paris – Fundado em 1956 na cidade que leva o seu nome, realiza uma média de 10 encontros por ano e tem 22 países membros que incluem o Brasil. Sua formação é decorrente de uma reunião que a Argentina aceitou fazer com seus credores na cidade de Paris;
3.2.5.2. Clube de Roma – Esse clube foi fundado em 1966 na cidade que leva o seu nome pelo industrial italiano Aurélio Peccei e pelo cientista escocês Alexander King. É na verdade um clube informal que reúne pessoas ilustres que debatem temas de política e economia internacional;
3.2.5.3. Clube de Bildenberg – Muitos acham que esse clube até não existiria, tamanho é o poder que ele reúne. Ele realiza uma conferência anual de caráter privado. Seu estabelecimento data de 1954 e reúne em torno de 150 das pessoas mais ricas e mais influentes e poderosas do planeta. Elas integram as elites econômicas da Europa e da América anglo-saxônica. São 18 as duas Nações que são membros. O nome do clube decorre do nome do hotel em que a primeira reunião foi realizada na cidade de Oosterbeek, que fica na Holanda. Seu objetivo de forma clara é promover o chamado atlantismo ou atlanticismo para reforçar os laços entre os Estados Unidos e a Europa, bem como apoiar o capitalismo ocidental e o livre mercado. Eles não escondem que almejam uma governança mundial. O seu conselho é composto por grandes empresas como a IBM, a Xerox, a Shell, a Nokia, a Daimler, entre outras.
3.2.6. Fórum de Davos – Fica em Genebra, Suíça, e realiza reuniões anuais na cidade de Davos por volta do final do mês de janeiro. Suas reuniões são anuais. O nome do encontro é Fórum Econômico Mundial ou na sigla inglesa World Economic Forum. Esse fórum reúne as principais lideranças políticas mundiais, mas também econômicas, intelectuais e jornalistas. É uma espécie de centro irradiador do pensamento capitalista mundial. Foi fundado em 1971 pelo professor Klauss Schwab. É uma instituição tão poderosa que conseguiu assento ainda que como membro observador do Conselho Econômico e Social da ONU. Diz genericamente que seu objetivo é a melhoria do estado do mundo.
3.2.7. OTAN: Vamos falar agora do braço militar armado do capitalismo ocidental. Trata-se da Organização do Tratado do Atlântico Norte ou na sigla inglesa North Atlantic Treaty Organization (www.nato.int). Sua fundação data de 4 de abril de 1949 e tem sua sede central na cidade de Bruxelas, na Bélgica. Apesar de ter formalmente 29 membros, quem manda e quem dá as cartas são mesmo os Estados Unidos. É, digamos assim, a guarda pretoriana europeia para a contenção da antiga União Soviética e a atual Rússia. Há alguns anos modificou os seus estatutos de forma a permitir que possa realizar operações militares e de guerra como agressões aos países fora do continente europeu, como foi o caso do bombardeio da Líbia em 2011 autorizado pelo Conselho de Segurança da ONU.
3.2.8. Sionismo internacional: Seu objetivo central é defender os interesses e a segurança do Estado de Israel. Tem larga influência sobre grande parte dos 55 bancos centrais existentes no mundo. Nos Estados Unidos se reúne em torno da sigla AIPAC, American Israel Public Affairs Committee, que significa Comitê de Assuntos Públicos de Israel dos EUA. É o maior lobbie existente nos Estados Unidos. Faz pesadas doações para os dois partidos que disputam as eleições, o Republicano e o Democrata.
3.2.9. Terrorismo fundamentalista: Apesar do discurso dos Estados Unidos, em especial desde setembro de 2001 quando as Torres Gêmeas em Nova York vieram baixo, de que que eles seriam contra o terrorismo, o que assistimos e presenciamos em várias partes do mundo é na verdade um apoio descarado a terroristas e atentados em várias partes do planeta. O caso mais escandaloso é o da Síria que desde abril de 2011 vem sendo atacada por terroristas e mercenários de mais de 80 países diferentes financiados pela Arábia Saudita com apoio dos Estados Unidos, de Israel e da Turquia (ver capítulo sobre a Síria). São as seguintes as siglas que integram esse terrorismo internacional: Al Qaeda, Estado Islâmico (antigo ISIS), Irmandade Muçulmana e mais os chamados jihadistas, salafistas, wahabitas e taqfiristas.
3.3. As instituições do campo da resistência: Veremos neste campo as principais entidades e/ou instituições que se opõem, de alguma forma, ao campo imperialista. É preciso registrar que não existe, digamos assim, uma articulação formal em todas elas, ainda que todas tenham um objetivo maior unificado. Algumas são entidades propriamente ditas, outras apenas movimentos ou articulações. O grau de consolidação de cada uma delas é bastante variável e comento isso em cada item especificamente.
3.3.1. BRICS – O correto sería usar a sigla “RICS”, pois o Brasil, tanto de Temer quanto de Bolsonaro, está subordinado agora ao imperialismo estadunidense. Ainda assim, acho difícil que saiamos dessa articulação que tem como objetivo claro se contrapor e conter o imperialismo estadunidense e, quiçá, criar uma moeda alternativa ao dólar ou, pelo menos, estabelecer comércio bilateral entre essas nações usando suas próprias moedas.
Em 2019 o Brasil deve assumir a presidência rotativa do BRICS. A China e a Rússia são os dois principais polos de poder nesta articulação internacional de países até porque são os únicos que possuem poder de veto no Conselho de Segurança das Nações Unidas. A primeira Cúpula do BRICS foi realizada em 16 de junho de 2009 na cidade russa de Ecaterimburgo. De lá para cá, foram realizados 10 encontros. Em 2019 está prevista a realização da décima primeira cúpula dos BRICS que deve acontecer no Brasil.
Tenho a firme convicção de que o processo de derrubada da presidente Dilma começa a acontecer quando aconteceu a cúpula dos BRICS em julho de 2013 em Fortaleza, no Ceará. Fui a este evento, onde foi criado o banco de desenvolvimento dos BRICS. Essa articulação de países já não escondia mais desde essa época a sua disposição de criar uma moeda alternativa ao dólar, ou pelo menos estabelecer uma cesta de moedas aceitas por todos os países.
O PIB estimado destes países gira em torno de 18,84 trilhões de dólares. Se considerarmos o PIB da Terra em torno de 80 trilhões de dólares, significa dizer que esta articulação de apenas cinco países já representa um quarto do total do PIB da terra. Em termos populacionais a estimativa é que a população da terra em 2017 era de 7,6 trilhões de habitantes. Dados mais atualizados mostram que esses cinco países juntos possuíam em 2017 um total de 3,06 trilhões de habitantes ou seja 40,26% de toda a população do planeta. Por fim vamos falar sobre a área geográfica desses países. Se considerarmos que a superfície terrestre de nosso planeta é de 510,072 milhões de quilômetros quadrados, estes cinco países juntos representam 40,105 milhões de quilômetros quadrados ou seja 7,8% de toda a superfície da terra[1].
3.3.2. Movimento dos Países não Alinhados – MPNA – Essa é uma articulação fundada nos anos 1950, fruto da divisão do mundo em dois campos, o campo capitalista e o chamado campo do socialismo real, liderado pela União Soviética. A China, que tinha feito a sua revolução em 1949, ainda não havia se firmado como potência entre o concerto das nações. Havia um conjunto de países que não se sentiam contemplados em nenhum desses dois campos, ou seja, não se colocavam nem como países capitalistas, nem como países socialistas. Algo como se quisessem dizer ao mundo que adotam atitudes e valores de ambos os sistemas.
Em 1995, foi convocada a sua primeira conferência, que ocorreu na cidade de Bandung, na Indonésia. Os principais líderes desse conclave foram Sukarno, anfitrião, Nehru, da Índia, e Nasser, do Egito. A formalização do Movimento deu-se apenas em 1961, na cidade de Belgrado, na Iugoslávia, em função da adesão do marechal Yosip Broz Tito. Nesse mesmo evento, a China uniu-se ao bloco com a presença na conferência de Chu En Lai.
Esse Movimento perdura até os dias atuais, mas não tem mais tanta força, até em função da unipolaridade que vivemos no mundo.
3.3.3. OUA e OLP – Estas duas siglas são importantes na articulação do campo da resistência. A primeira delas, trata-se da Organização da Unidade Africana, fundada em 25 de maio de 1963, na cidade de Adis Abeba, na Etiópia, convocada que foi pelo seu imperador Haile Salassie. Nesse primeiro evento estiveram presentes 32 países fundadores. Seu grande objetivo é promover a unidade dos estados africanos. Na época a questão central era a luta anticolonialista.
A segunda sigla, OLP significa Organização para a Libertação da Palestina. A sua fundação ocorreu em maio de 1964, a partir de uma convocação feita pela Liga dos Países Árabes. A assembleia de fundação deu-se na cidade de Jerusalém e seus estatutos foram promulgados no dia 28 de maio. Seu primeiro presidente foi Ahmad Shukairy, um advogado moderado. Yasser Arafat vai assumir a liderança somente em 1969, quando o grupo Al Fatah já era a maior organização entre as dez que compõem a sua estrutura. Arafat torna-se o chefe do Estado Maior das forças revolucionárias palestinas em 1971 e em 1973 já era o seu líder político. Em 1974 irá fazer um pronunciamento histórico na Assembleia Geral das Nações Unidas.
3.3.4. Islã Xiita – Ainda que eu sempre diga que o conflito no Oriente Médio é essencialmente político e não religioso, é preciso reconhecer que os muçulmanos de orientação xiita possuem, seguramente, uma compreensão mais nítida e clara sobre o inimigo principal da humanidade. A revolução que eles fizeram no Irã em fevereiro de 1979 foi a expressão máxima disso. Até os dias atuais, o Irã segue na linha de frente do chamado Arco da Resistência na região, onde também integram os países Iraque, Síria e Líbano, além do Partido de Deus Libanês (Hezbollah). Isso não significa dizer que não tenhamos muçulmanos sunitas neste campo. Mas, parte dos sunitas até os dias atuais defendem o estabelecimento do chamado Califado Islâmico, que hoje se expressa no agrupamento terrorista denominado Estado Islâmico, que tantos males vem causando ao Iraque e à Síria.
3.3.5. América Bolivariana – O comandante Hugo Rafael Chávez Frias (1954-2013) venceu as eleições presidenciais venezuelanas e tomou posse em dezembro de 1998. Ele inaugura um novo ciclo em todo o continente latino-americano, mais progressista e de centro esquerda. Sofre uma tentativa de golpe em abril de 2002, ano em que Lula venceria as eleições pela primeira vez, abrindo também um novo ciclo no Brasil de quatro governos progressistas, só interrompido com o golpe de 2016.
Chávez expande pelo continente a sua chamada revolução bolivariana, ou o seu “socialismo do século XXI”. Por mais que a grande imprensa mencione de forma unificada que se vive na Venezuela uma “ditadura” (sic), em 20 anos de governos bolivarianos na Venezuela quase 20 eleições e/ou consultas populares foram feitas. Após a sua vitória, veio a de Evo Morales na Bolívia e Rafael Corrêa no Equador. E tantas outras. Todas inspiradas no ideal de Simon Bolívar (1783-1830), considerado o libertador da América espanhola.
Com o governo progressista de Chávez e Lula, foram criadas instituições como a UNASUL (União das Nações Sul-Americanas), a CELAC (Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos), esta última em uma clara tentativa de isolar a velha e pró-EUA OEA (Organização dos Estados Americanos). Criou-se ainda a TeleSur, a primeira rede de notícias alternativas e progressista para enfrentar os monopólios da mídia. Indicou-se a criação de um Banco do Sul, gasodutos unificados no continente. Ou seja, inaugurou-se um novo ciclo desenvolvimentista no subcontinente, que influenciava outros países. É possível que a correlação de forças mude para a maioria dos países voltarem para a órbita estadunidense. Hoje, pode-se dizer que ainda resistem Cuba, a própria Venezuela, Bolívia, Uruguai, El Salvador e mais recentemente o México, com o novo presidente Antônio Manuel Lopes Obrador.
3.3.6. – Fórum Social Mundial – Organizado por ONGs e movimentos sociais do mundo inteiro, a partir de 2001, na cidade de Porto Alegre, inaugura-se um evento de caráter internacional que atrai pessoas e organizações de todos os cinco continentes. Seu slogan era: “um outro mundo é possível”. As suas seis primeiras edições – que tive a honra de participar de todas elas – foram realizadas em POA/RS. A partir da sétima, outros países abrigaram o evento, que era organizado a partir de um Comitê Internacional. A 16ª edição do FSM ocorreu na cidade de Salvador em março de 2018. O Fórum tem suas limitações. Ele não é uma articulação. Ao final ele aprova um documento como se fosse uma espécie de resolução, mas que não contém orientações de como devemos nos organizar em todos os lugares para opor resistência ao imperialismo. De qualquer forma, é uma instituição do campo da resistência.
3.3.7. Entidades representativas internacionais dos segmentos – São antigas instituições, geralmente instituídas no período do auge da chamada Guerra Fria e apoiadas pela antiga União Soviética. Ela agrega os setores da juventude, estudantes, trabalhadores, mulheres e de luta pela paz. Todas essas entidades seguem existindo até os dias atuais, mas vivendo sempre com muita dificuldade. São as seguintes: FDIM – Federação Democrática Mundial de Mulheres; CMP – Conselho Mundial da Paz, presidida por uma brasileira, Socorro Gomes; UIE – União Internacional dos Estudantes; FMJD – Federação Mundial da Juventude Democrática e FSM – Federação Sindical Mundial, que representa em torno de 100 milhões de trabalhadores e tem sede na cidade de Atenas, na Grécia. A FSM tem filiadas as maiores e mais combativas centrais sindicais nacionais de países importantes. Tem uma orientação claramente anticapitalista e a favor do socialismo. No Brasil apenas a CTB e a CGTB são filiadas a ela (a CUT e a Força são filiadas à Central Sindical Internacional, que surgiu fruto da fusão de uma central sindical católica com uma outra social democrata).
3.3.8. Organização de Cooperação de Xangai – Ou na sigla inglesa Shangai Cooperation Organization. É uma organização política e econômica de cooperação, mas fundamentalmente militar que atua na Eurásia. Foi fundada em Xangai em 2001 e inicialmente reunia apenas a China, a Rússia, o Cazaquistão, o Quirguistão, o Tadjiquistão e o Uzbequistão. Em 2017, a Índia e o Paquistão tornaram-se membros plenos da Organização. Seu objetivo é estabelecer a cooperação para a segurança multilateral dos países membros, em especial na sua luta contra o terrorismo financiado e apoiado pelo imperialismo estadunidense. Luta também contra o separatismo e o extremismo. Na prática, é uma organização de cooperação militar que visa fazer frente ao poderio militar da OTAN. Tal qual os BRICS, a OCX menciona também a criação de moedas alternativas ao dólar para o comércio exterior. Tem dado total apoio à nuclearização dos seus países membros. Ainda ouviremos falar muito dessa instituição.
3.3.9. Foro de São Paulo – É uma organização política que reúne os partidos de esquerda da América Latina. Atualmente, congrega 111 organizações. Foi fundada em São Paulo no dia 4 de julho de 1990. Sua principal proposta é defender a integração latino-americana e lutar contra as políticas neoliberais que assolam o subcontinente. Sua página na Internet é www.forodesaopaulo.org. Até o ano de 2017 foram realizados 23 encontros dessa instituição, que normalmente se reúne a cada dois anos. Lula foi um dos fundadores, a partir da primeira reunião convocada pelo Partido dos Trabalhadores[2].
3.3.10. Encontros Internacionais de Partidos Comunistas e Operários – Já realizou ao todo 20 encontros, sendo que o de 2018 foi realizado em 25 de novembro na Grécia. Seu primeiro encontro ocorreu em 1998 e tem periodicidade anual. Reúne em torno de 70 partidos comunistas (o nome “operários” vem do fato que alguns PCs em alguns países não levam o nome de “Comunista”, mas o são. Alguns estão no poder (China, Cuba, Laos, Coreia e Vietnã) e a maioria são de oposição. Em alguns poucos casos, os comunistas participam de governos progressistas e patrióticos, mesmo não tendo hegemonia. Não se propõe ser uma Internacional Comunista como foram a 1ª, fundada pelo próprio Karl Marx com o nome de Associação Internacional dos Trabalhadores em 1867. Houve uma 2º, que não funcionou. A melhor organizada foi fundada pelo próprio Lênin em março de 1919, pouco depois de sua revolução de outubro de 1917. Lênin convocou todos os partidos comunistas existentes no mundo inteiro para debater como deveriam se organizar para combater o capitalismo e como fortalecer e prestar solidariedade à jovem República Socialista da Rússia (a URSS só sería constituída formalmente em 30 de dezembro de 1922). A 3ª Internacional foi dissolvida em 15 de maio de 1943, para ampliar as frentes de combate ao fascismo e ao nazismo, que tinham os comunistas na linha de frente, mas que era muito mais ampla que isso. Leon Trotsky articula uma outra, que chamou de 4ª Internacional em 1938, que teve muitos rachas, mas tem ainda alguma expressão e aglutina exclusivamente partidos e organizações trotsquistas.
Como sempre temos dito e isso já há alguns anos, vivemos uma longa transição entre um mundo unipolar para um mundo de multipolaridade. Ainda estamos longe, a meu ver, de conquistarmos um mundo de maior equilíbrio de poder, tanto político, quanto econômico e especialmente militar. Nenhum país do mundo hoje, nem a grande China, consegue fazer frente ao poderio militar estadunidense. Mas não é só nesse aspecto que existe a hegemonia dos EUA. É também no campo econômico, quando ele emite a moeda que é praticamente universal, tem a língua considerada franca e mais falada como segundo idioma das pessoas e tem uma hegemonia cultural e ideológica que está longe de ser alterada.
Seus valores morais se espalham pelo mundo afora e penetram até em sociedades mais fechadas, como são as de religião islâmica que ainda resistem à sua ideologia. No caso do nosso Brasil, vemos isso diariamente quando centenas de palavras inglesas invadem nosso cotidiano, nos shoppings centers, nas TVs. A sua festa de Halloween já é o dia das bruxas, já é comemorado no dia 31 de outubro em nosso país em várias escolas de elites e privadas no país.
Viveremos ainda muitas idas e vindas. Agora mesmo, nosso Brasil – e provavelmente alguns outros países latino-americanos – viveremos imensos retrocessos civilizatórios e perda de direitos dos trabalhadores com a posse do governo reacionário e entreguista de Jair Bolsonaro. No entanto, estou convicto que a marcha inexorável da história nos levara a um caminho luminoso de um mundo de justiça e paz para os povos amantes da liberdade e que defendem a sua soberania nacional.
(*) Sociólogo, escritor, professor universitário, pesquisador e analista internacional; colunista da Revista Sociologia
[1] Esses dados são os mais atualizados possíveis e tiveram como fonte a enciclopédia livre e cooperada Wikipédia, cujo endereço as pessoas podem ter acesso por este link: http://pt.wikipedia.org.
[2] Neste endereço na Internet https://pt.wikipedia.org/wiki/Foro_de_S%C3%A3o_Paulo que tivemos acesso em 26 de dezembro de 2018 às 10h51 há uma riqueza imensa de informações adicionais, em especial a lista por países de todos os partidos que compõe o FSP, atribuindo-lhe inclusive a condição de “partido no governo’ ou de oposição.